domingo, 7 de fevereiro de 2016

Estudos Bíblicos no Livro de Malaquias (5) - Servindo e adorando a Deus mesmo diante da incompreensão do bem e do mal

Malaquias 2.17-3.6

No estudo anterior em Malaquias 2.10-16 com o tema A infidelidade a Deus quebra a aliança e profana o culto, vimos () A Infidelidade a Deus leva ao colapso nas relações humanas e profana o culto – vv.10-12; e () A Infidelidade à Deus leva ao cinismo e cauterização da consciência – vv.13-16.

Vimos, também, que por duas vezes Deus diz aos homens para que cuidem de si mesmos e não sejam infiéis – vv.15, 16. O que isso significa? Significa que devem vigiar o coração, os olhos, obedecer à Palavra de Deus, seguir o que ele manda, ser de fato o cabeça do lar, amar sua mulher como Cristo ama a Igreja. Se os homens cuidarem de si mesmos a situação será bem diferente.

E terminamos com as seguintes lições e aplicações: 1ª) Que Deus zela pela identidade do seu povo – por isso ele é claro nas Escrituras sobre os relacionamentos que devemos ter, não somente na área afetiva, mas em todas áreas que possam atrapalhar a nossa fé e prejudicar a igreja; 2ª) Que há uma relação fundamental entre a nossa vida pessoal e moral e o culto que prestamos a Deus – por isso Deus se preocupa e nos instrui nas Escrituras quanto ao nosso testemunho onde quer que estejamos.

Hoje, em nosso estudo, vamos ver Malaquias 2.17-3.6, com o tema: Servindo e adorando a Deus mesmo diante da incompreensão do bem e do mal.

Chegamos na metade do texto do livro e o padrão dialógico é o mesmo: 1) Uma declaração de Deus; 2) Um questionamento do povo; 3) Uma resposta de Deus.

Os questionamentos do povo e dos seus líderes, em cada afirmação de Deus, continuam: 1) Deus nos ama mesmo? 2) Em que estamos profanando o culto a Deus? 3) Por que Deus não aceita nossa oferta? 4) Por que Deus não aceita nossos sacerdotes? 5) Em que estamos desagradando a Deus? 6) Em que estamos roubando a Deus? 7) Em que estamos difamando a Deus?

Agora, vemos que “a denúncia dos pecados de Israel é seguida de uma declaração de castiço sobre os impenitentes e de bênçãos para o remanescente fiel. O v.17 serve como introdução para o restante do livro. O povo e os sacerdotes incrédulos e desobedientes haviam esgotado a paciência de Deus com seu ceticismo e suas desculpas, de modo que a punição estava a caminho”.[1]

Uma coisa a observar, é que, o v.17 levanta uma questão que é um dos dilemas mais antigos para a doutrina cristã – o problema do mal. O termo teológico que dá nome a esse assunto é teodiceia, que é o estudo do problema do mal e sua origem. A teodiceia procura responder a algumas perguntas como: Se Deus é bom, porque existe o mal? Como pode existir o mal em um Universo governado por um Deus justo, bom e todo-poderoso? Mas, como afirma Augustus Nicodemus, a questão vai mais além: Como um Deus justo, bom e todo-poderoso permite que o mal exista em seu Universo, que ímpios prosperem e pequem abertamente sem ser castigado? E por que ele permite que o justo sofra neste mundo?[2]

Há três tentativas de respostas básicas para essas indagações: 1ª) A resposta do ateísmo – Se o mal existe, a conclusão deles é que Deus simplesmente não existe. A natureza é determinista, não segue qualquer princípio ou ordem moral. O mal faz parte do Universo e não existe um Deus bom nem justo que possa impedir o mal; 2ª) A resposta das religiões orientais – Em sua maioria negam a existência do mal. Alegam que o mal é simplesmente uma projeção da mente humana e que há um nível de espiritualidade, que quando alcançada o mal e a dor deixam de existir para a pessoa. Um tipo de meditação transcendental, que tenta resolver o problema do mal negando a própria existência do mal; 3ª) A resposta da teologia relacional ou teísmo aberto – Não é culpa de Deus que o mal exista no mundo, porque Deus não é todo-poderoso nem onisciente. Deus se esvaziou de sua onisciência e de sua onipotência para poder se relacionar de maneira ideal com as pessoas, a fim de que não fossemos meras peças de um jogo de xadrez em suas mãos.[3]

A resposta do cristianismo bíblico para a questão do mal é a seguinte: Deus existe e é todo-poderoso, bom e justo, mas, também, o mal existe, ele é real. Mesmo que não possamos entender os motivos por que Deus permite que mal exista e atinja pessoas indistintamente, podemos afirmar que ele é justo, santo, bom, todo-poderoso, e que o mal existe neste mundo por permissão dele. Embora nem sempre possamos entender isso claramente, de uma coisa podemos ter certeza: haverá um dia em que Deus julgará todo o mal.[4] (cf. Sl 25.8; 35.8; 86.5; Mt 19.17; Sl 119.137; At 17.31; 1Pe 1.16; Gn 17.1; 2Co 6.18; Is 45.7) Essa questão da incompreensão sobre o problema do mal é bem antiga e podemos ver isso no Sl 73, no livro de e no livro de Eclesiastes.

Agora, o que vemos no texto, é o povo de Israel, cinicamente, usar isso para questionar a justiça de Deus em relação a sua situação. A atitude israelita era repreensível à vista de Deus; pois as pessoas tinham se tornado incrédulas, presumindo que, se existia um Deus, Ele já não interviria mais para exercer o juízo contra o mal e os que praticavam o mal. Deus, entretanto, advertia que o juízo, embora tardio, certamente viria.[5]

Por isso, seguindo o padrão do texto do livro, vamos ver () a declaração de DeusO que Deus diz a respeito da atitude cética do seu povo (2.17a), () o questionamento do povoComo o povo de Deus reage diante da incompreensão do bem e do mal (2.17b) e () a resposta de DeusA solução apresentada por Deus ao seu povo (3.1-6).


I. A declaração de Deus – O que Deus diz a respeito da atitude cética do seu povo (2.17a)

O que vemos aqui é uma declaração muito forte da parte de Deus através do profeta Malaquias – Enfadais ao SENHOR com vossas palavras... Era essa a mensagem que o profeta estava entregando nos quatro quantos da cidade de Jerusalém.

No hebraico a palavra enfadar significa irritar, provocar e aborrecer e, assim, gerar cansaço, desanimo e enfado. O povo estava irritando, provocando e aborrecendo Deus com as suas palavras e seus questionamentos, e Deus já estava cansado, enfadado do povo.[6]

O que estava acontecendo é que os judeus se tornaram indiferentes para com o Senhor. Insensíveis e desprovidos de discernimento espiritual, insistiam em expressões cínicas de inocência. Não tinham nenhuma intenção de levar a sério a distinção entre o certo e o errado.[7] O profeta Isaías falou sobre esse tipo de atitude do povo na sua época e como eles estavam cansando a Deus com as suas iniquidades – Is 43.22-28.

Deus em sua soberania estabeleceu um limite para ele mesmo lidar com o seu povo e com o mundo, podemos ver isso em algumas passagens – cf. Jr 7.16; 11.14; 15.1; Rm 11.25; Gn 18.16-33; 2Co 12.7-10. Quando chega no limite estipulado por Deus, Ele age de modo imediato como no caso do Dilúvio (cf. Gn 6.1-8.19), da torre de Babel (cf. Gn 11.1-9), de Sodoma e Gomorra (cf. Gn 18.1-19.38), da Igreja de Tiatira (cf. Ap 2.20-23).

O que estava enfadando Deus, eram as “ofensas que giravam em torno da rejeição cínica do governo moral de Deus e do contínuo espírito insolente que constantemente coloca Deus à prova”[8].

II. O questionamento do povo – Como o povo de Deus reage diante da incompreensão do bem e do mal (2.17b)

O povo havia questionado o amor de Deus, a sua fidelidade e agora estava questionando a sua justiça. “A hipocrisia presunçosa estava tão arraigada no coração deles que ousavam questionar o Senhor com insolência, dando a entender que ele parecia favorecer os perversos e não se importar com os justos”[9].

O argumento deles era que: Considerando que muitos desfrutam de prosperidade material, embora violando definidamente a lei moral, se existe um Deus, Ele ao que parece, os favorece. A própria existência de um Deus onipotente e justo estava sendo posta em dúvida. A insinuação era que se Deus existia, Ele devia ter agido.[10]

Então, por falta de discernimento, “além de tentarem fazer aquele que pratica o mal passar por um homem bom, davam a entender que Deus se agradava do mal e não executava juízo imediato”[11].
O que levou a esse questionamento foi o fato da situação que Israel estavam enfrentando – opressão espiritual, política continuada e privação econômica[12] (cf. Ne 1.3; 9.36, 37). Portanto, a nação de Israel era minúscula, encravada no meio da Palestina, cercada de inimigos por todos os lados e enfrentando momentos difíceis[13] em todas as áreas. Isso fez com que o povo ao invés de colocar a vida em ordem e buscar a Deus, passasse a questionar a integridade de Deus como juiz, ou seja, a sua justiça – onde está o Deus do juízo?

O povo de Israel se manifesta mais uma vez, com seu senso próprio de justiça, levantando esse tipo de questionamento, e então temos a resposta de Deus[14] (vv. 3.1-5).

III. A resposta de Deus – A solução apresentada por Deus ao seu povo (3.1-5)

Claramente, Deus refuta as duas declarações cínicas do povo em 2.17. A alegação de que Deus não diferencia entre o bem e o mal é respondida no v.2 ao referir-se ao ministério de aperfeiçoamento e purificação do mensageiro da Aliança (v.1b). A segunda declaração: onde está o Deus do juízo? (2.17b), é respondida no v.5. Eles esperavam que Deus julgasse as nações, mas ao invés disto, o Senhor se aproximará deles para juízo (v.5).[15]

A resposta de Deus é completamente diferente daquilo que talvez os israelitas pudessem estar esperando. É uma resposta inesperada. Deus diz ao povo: Vocês querem ver justiça? Querem que eu mostre a diferença entre o justo e o injusto? Então farei isso, mas começarei por vocês. Vou punir os ímpios, mas começarei pelos ímpios que estão no meio de vocês. Então vou fazer diferença entre ímpios e justos, mas não em relação aos que são de fora. Antes, farei essa diferença entre os que estão no meio de vocês, entre aqueles que são verdadeiramente meus servos e os que não são.[16]

Pensando na igreja do Novo Testamento e em nossa situação como igreja hoje, veja o que Pedro disse em 1Pe 4.12-19.

A resposta de Deus nos vv.1-5 vem em forma de profecia. Até então, o profeta Malaquias tem falado ao povo de forma exortativa. Agora, ele traz uma profecia sobre o futuro. Essa profecia está dividida em três partes:

Primeira parte da profeciao anuncio do mensageiro precursor v.1aEis que eu envio o meu mensageiro, que preparará o caminho diante de mim; ...Fazendo um trocadilho com o nome de Malaquias, o Senhor mesmo anuncia que está enviando alguém que preparará o caminho diante dele. É a voz do que clama no deserto (cf. Is 40.3) e o Elias de Ml 4.5 que o Senhor enviará. O Novo Testamento identifica claramente esse mensageiro como João Batista (cf. Mt 3.3; 11.10, 14; 17.12; Mc 1.2; Lc 1.17; 3.4; 7.26, 27; Jo 1.23).[17]

João, em sua mensagem de arrependimento, atacava a decadência moral e a formalidade religiosa vazia, preparando assim o caminho para a ênfase de Cristo sobre a regeneração e o culto espiritual. Ele foi o arauto da vinda de Cristo.[18]

Segunda parte da profeciao aviso sobre a chagada do mensageiro da Aliança v.1b... e de repente virá ao seu templo o Senhor, a quem vós buscais; e o mensageiro da aliança, a quem vós desejais, eis que ele vem, diz o SENHOR dos Exércitos.

Na primeira parte, Deus diz que vai mandar um mensageiro para preparar o seu caminho; na segunda parte, ele avisa que virá como mensageiro da Aliança, no devido tempo, repentinamente, de maneira inesperada.

O Senhor e o Anjo da aliança, todos se referem a uma única pessoa divina – o Senhor Jesus Cristo. A vida inesperada de Cristo, cumprida parcialmente em seu primeiro advento, se concretizará de modo pleno em seu segundo advento (cf. Mt 24.40-42).[19]

Para MacArthur, quando todos os preparativos tiverem sido concluídos, o Senhor virá, não para o templo de Zorobabel, nem em cumprimento parcial para o templo de Herodes, mas para o templo do milênio, descrito em Ez 40-48.[20]

Referindo-se ao templo, Moody diz que: na Nova Dispensação, o santuário de Deus, antes o Jardim do Éden, mais tarde o Tabernáculo e depois o Templo, seria a Igreja (cf. 1Co 3.16, 17; Ef 2.21; 1Pe 2.5).[21]

Aquele a quem o povo dizia que buscava e desejava a sua vinda estava vindo. Mas, não como eles achavam que deveria ser. Ele exerceria um ministério integral e colocaria as coisas em ordem em Israel e no mundo inteiro.

Terceira parte da profeciao ministério do mensageiro da Aliança – vv.2-5.

v.2 – inicialmente o ministério do mensageiro da Aliança é comparado a dois agentes de purificação: o fogo que queima a escória e o sabão (potassa) dos lavadeiros que branqueia, uma indicação do verdadeiro estado do coração do povo. Isso indica que o Senhor virá para remover todas as impurezas. Ninguém escapará dessa purificação.[22]

v.3 – Uma vez que os sacerdotes levíticos haviam sido instrumentos para afastar o povo de Deus, por eles começaria a purificação. Assim, as ofertas serão justas porque serão apresentadas com um coração puro e uma situação correta diante de Deus.[23] Por causa da obra do mensageiro da aliança, a adoração correta e apropriada será novamente oferecida, visto que os corações e vidas dos ofertantes estarão purificados[24] (cf. Sl 4.5; 3.9).

v.4 – Depois que o sacerdócio for purificado e o povo limpo, então poderão oferecer sacrifícios agradáveis ao Senhor como nos dias de Salomão (2Cr 7.8-10), Ezequias (2Cr 30.26), Josias (2Cr 35.18) e Esdras (Ne 8.7).

v.5 – O Senhor agora expõe o que está por traz de todos os questionamentos do povo e promete ser uma testemunha veloz contra os ímpios no meio do povo de Deus, isto é, Ele “não haverá apenas de purificar seu povo para que lhe renda um culto verdadeiro, mas será testemunha veloz, aquele que haverá de condenar os ímpios que estão no meio do seu povo”[25].

Quem são esses ímpios no meio do povo de Deus? São aqueles que transgridem deliberadamente o que a lei de Deus proíbe: feitiçaria (cf. Êx 22.18), adultério (cf. Êx 20.14), falsos juramentos (cf. Lv 19.10), retenção de salários (cf. Lv 19.12), opressão a viúva e ao órfão (cf. Êx 22.22-24), tratamento injusto de um estrangeiro (cf. Dt 24.17) e falta de temor a Deus (cf. Êx 20.1-6; Pv 1.7). Os comportamentos iníquos descritos nesse versículo comprovam que tais pessoas não temem a Deus.

MacArthur diz, em relação ao futuro, que “para o remanescente judeu arrependido que reconhecer o Messias, o castigo divino será um processo de refinamento (cf. Zc 12-14; Rm 11.25-27) em preparação para entrar no reino e adorar no templo do milênio”.[26]

Concluindo

Agora, no v.6, Deus explica porque fará tudo isso. Deus não muda em seu propósito de ter um povo, não muda em sua aliança com o seu povo. Em vez de destruir os filhos de Israel (Jacó) porque já não prestavam um culto que lhe fosse agradável, ele mesmo iria purificá-lo e julgar os que, dentre o seu povo, não o temiam e praticavam toda sorte de iniquidade.[27]

A imutabilidade de Deus fica declarada claramente no v.6aPorque eu, o SENHOR, não mudo... E porque Deus não muda, não pode jamais alterar Sua atitude para com o pecado que é o juízo, que por mais adiado que seja, Ele certamente executará. A imutabilidade de Deus também é a garantia da graça de Deus[28] – ... por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos. (v.6b) Porque Deus não muda, ele manteve a aliança, purificou-a e renovou-a, para que continuasse a ter um povo para si querido, especial, regatado pelo sacrifício de seu Filho[29] (cf. Dt 7.6; Tt 2.14). E a Sua imutabilidade, também, é a causa de não sermos consumidos (cf. Lm 6.22)

Quatro lições e aplicações: 1ª) O culto a Deus deve ser agradável a Ele; 2ª) Só cristãos lavados no sangue de Jesus prestam culto verdadeiro a Deus; 3ª) Vale a pena continuar a servir e cultuar a Deus mesmo que não entendamos completamente a questão do mal e do bem; 4ª) Devemos adorar a Deus na esperança daquele dia em que o adoraremos na eternidade. (cf. Rm 12.1, 2)

Pr. Walter Almeida Jr.
IBL Limeira - 07/02/16




[1] MacArthur, John. Bíblia de Estudo MacArthur, SBB, 2010, p. 1183.
[2] Lopes, Augustus Nicodemus. O culto segundo Deus: a mensagem de Malaquias para a igreja de hoje, Vida Nova, SP, 2012, p. 90.
[3] Lopes, p. 91, 92.
[4] Lopes, p. 92, 93.
[5] Comentário Bíblico Moody, Malaquias, p. 10.
[6] Lopes, p. 94.
[7] MacArthur, p. 1183.
[8] Bíblia de Estudo de Genebra, ECC e SBB, 2004, p. 1091.
[9] MacArthur, p. 1183.
[10] Comentário Bíblico Moody, Malaquias, p. 10.
[11] Ryrie, p. 894.
[12] Carson, D. A. Comentário Bíblico Vida Nova, Vida Nova, 2009, p. 1332.
[13] Lopes, p. 96.
[14] Lopes, p. 96.
[15] Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1091.
[16] Lopes, p. 97.
[17] MacArthur, p. 1183.
[18] Comentário Bíblico Moody, Malaquias, p. 10.
[19] MacArthur, p. 1183.
[20] MacArthur, p. 1183.
[21] Moody, p. 11.
[22] MacArthur, p. 1184.
[23] MacArthur, p. 1184.
[24] Bíblia de Estudo de Genebra, p. 1092.
[25] Lopes, p. 102.
[26] MacArthur, p. 1184.
[27] Lopes, p.104.
[28] Moody, p. 12.
[29] Lopes, p. 103.

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