No estudo anterior em Gálatas 1.11-24 com o tema: O Evangelho Verdadeiro, vimos que: 1º) O
evangelho verdadeiro não foi dado para agradar aos homens – v.11; 2º) O evangelho verdadeiro
vem diretamente de Deus – vv. 12;
3º) O evangelho verdadeiro transforma o mais vil pecador – vv.13-24.
E terminamos com as seguintes lições: 1ª) O verdadeiro evangelho transforma vidas;
2ª) O verdadeiro evangelho dá uma nova
missão para a vida daqueles que são transformados; e 3ª) O verdadeiro evangelho cria uma nova
família, a igreja de Deus.
Hoje, vamos estudar Gálatas 2.1-10 com o tema: Somente
um evangelho. Faremos isso em três pontos: 1º) Somente um evangelho
apostólico – vv.1-3; 2º) Somente
um evangelho para a salvação – vv.4-8;
3º) Somente um evangelho da comunhão – vv.9, 10.
Paulo mostrou no capítulo 1 que o seu evangelho vinha
de Deus e não dos homens. Agora, ele mostra que o seu evangelho não é
diferente, mas precisamente o mesmo dos outros apóstolos. Warren Wiersbe diz
que, Paulo explicou no capítulo 1 sua independência dos outros apóstolos;
agora, no capítulo 2, destaca sua interdependência com respeito aos apóstolos.[1]
I. Somente
um evangelho apostólico – vv.1-3
Já vimos, no primeiro estudo, que Paulo fez cinco
viagens a Jerusalém depois de sua conversão. A primeira delas ocorreu três anos após sua conversão (1.17, 18; At 9.26), quando passou
quinze dias com o apóstolo Pedro e com Tiago (1.18, 19). A segunda visita
está relacionada ao socorro financeiro que Barnabé e ele levaram aos pobres da
Judeia (At 11.29, 30; 12.25). A terceira visita tem a ver com o
Concílio de Jerusalém para resolver a questão judaizante (At 15.2-29). A quarta visita
foi uma passagem muito rápida ao final da segunda viagem missionária e antes da
terceira viagem missionária (At 18.22).
A quinta e última visita de Paulo a
Jerusalém aconteceu quando ele foi levar uma oferta das igrejas da Macedônia e
Acaia aos pobres da Judeia, ocasião em que o apóstolo terminou preso (At 21.17).[2]
Essa visita mencionada por Paulo aqui, pode ter sido a
segunda ou a terceira visita, mas, não temos como afirmar com certeza qual
delas foi. O que podemos afirmar com certeza é que “foi uma reunião com
consequências enormes para todos nós, mesmo hoje”[3].
Hernandes Dias Lopes destaca nos vv.1 e 2 três pontos importantes:[4]
1º) Os
companheiros de Paulo – v.1 – Ambos são importantes na defesa do evangelho pregado
por Paulo. Barnabé foi o companheiro de Paulo na primeira viagem missionária, e
Tito era filho na fé de Paulo (Tt 1.4).
Barnabé, sendo judeu, estava de pleno acordo com o evangelho pregado por Paulo,
evangelho esse que não foi modificado pelos apóstolos de Jerusalém (2.6-10); e Tito, sendo um gentio, foi
aceito sem precisar submeter-se ao rito da circuncisão (2.3-5).
Citado oito vezes em 2Coríntios e uma vez em 2Timóteo,
Tito foi o destinatário da carta do Novo Testamento que leva o seu nome (Tt 1.4). Donald Guthrie ressalta que o
ponto principal da menção de Tito é dar exemplo de um gentio cristão cujo
relacionamento com a circuncisão pode ser considerado típico para todos os
gentios.
John Stott quando diz que Paulo levou Tito a Jerusalém
não para despertar atritos, mas para estabelecer a verdade do evangelho: que judeus e gentios são aceitos por Deus
nos mesmos termos, a saber, a fé em Jesus Cristo, e, portanto, todos devem ser
aceitos pela igreja sem nenhuma discriminação.
2º) motivação de Paulo – v.2a. Paulo foi a Jerusalém em obediência a uma revelação
divina, e não por uma convocação humana. Ele foi não para buscar aprovação dos
homens, mas para obedecer a um mandato de Deus; não para receber autorização
dos apóstolos de Jerusalém para pregar, mas para defender o evangelho que
pregava. Como diz Calvino, Paulo não foi posto no ofício apostólico por
determinação dos outros apóstolos; foi reconhecido por eles como um apóstolo.
3º) o propósito de Paulo – v.2b. O propósito dessa viagem de Paulo a Jerusalém era
expor o evangelho pregado por ele entre os gentios aos cristãos de Jerusalém e
aos apóstolos. O propósito de Paulo era provar que não havia uma fenda entre
ele e os demais apóstolos. Não havia dois evangelhos, nem conflito entre os
apóstolos. Os ministérios eram diferentes, mas o evangelho era o mesmo. Os
mensageiros tinham dons e campos de atuação diferentes, mas a mensagem era a
mesma.
Quando os líderes da igreja em Jerusalém reconheceram
que um gentio era salvo pela fé em Cristo, sem ter sido circuncidado (v.3), em outras palavras, eles estavam
dizendo que: o Evangelho que Paulo pregava e ensinava também era o Evangelho
que eles pregavam e ensinavam. Caso contrário, eles teriam rejeitado a Tito e
corrigido o Evangelho pregado por Paulo. Assim, temos somente um evangelho
apostólico.
Como um verdadeiro cristão, Tito era a prova viva de
que a circuncisão e os regulamentos mosaicos não eram pré-requisitos ou
componentes necessários da salvação. A recusa dos apóstolos de requerer a
circuncisão de Tito autenticou a rejeição da igreja à doutrina dos judaizantes.[5]
Portanto, a aceitação de Tito pelos crentes judeus
serviu como ilustração do princípio segundo o qual o indivíduo se torna
espiritualmente puro e aceitável através de Cristo, e não por meio de quaisquer
feitos ou rituais. Os gentios podem tornar-se membros plenos do povo de Deus
sem se tornarem judeus em costumes e cultura.[6]
II. Somente
um evangelho para a salvação – vv.4-8
Paulo dedicou metade dessa narrativa relativa ao concílio
de Jerusalém à explanação do resultado do concílio, expresso tanto negativa (vv.6, 10) quanto positivamente (vv.7-9). Em contraste com as afirmações
dos judaizantes, o fato foi que os três (Tiago, Pedro e João) não impuseram
mudanças ao seu ministério e mensagem.[7]
Observemos o texto mais detalhadamente:[8]
ð E isto por causa dos falsos irmãos (v.4a) – judaizantes,
que fingiam ser verdadeiros cristãos; todavia sua doutrina, que alegava obediência
a Cristo, se opunha ao judaísmo tradicional e, como exigia circuncisão e
obediência à Lei Mosaica como pré-requisito para a salvação, opunha-se ao cristianismo.
ð que se
intrometeram, e secretamente entraram a espiar a nossa
(v.4b) – a palavra, em grego, retrata espiões ou traidores entrando em
segredo no acampamento do inimigo. Os judaizantes eram agentes furtivos de
Satanás, enviados para o meio da igreja a fim de sabotar o verdadeiro
evangelho.
ð liberdade,
que temos em Cristo Jesus (v.4c) – os
cristãos estão livres da lei como meio de salvação, de seus regulamentos cerimoniais
externos como modo de vida e de sua maldição pela obediência à lei – uma maldição
que Cristo suportou em favor de todos os cristãos (3.13). Essa liberdade não é, contudo, uma licença para pecar (5.13).
ð para
nos porem em servidão (v.4d) – transmite
a ideia de escravidão absoluta a um sistema de obras de justiça impossível.
ð v.5 – Paulo e Tito nunca abandonaram a sua posição sobre
a salvação pela graça mediante a fé.
ð E, quanto
àqueles (v.6) – outra referência a Pedro, Tiago e João.
ð que
pareciam ser alguma coisa (v.6) – o privilégio único
dos 12 não tornava seu apostolado mais legítimo ou autorizado que o de Paulo –
Cristo comissionou os 13 (cf. Rm 2.11).
John Stott enfatiza que as palavras de Paulo não são uma negação da autoridade
apostólica deles, nem uma indicação de desrespeito. Paulo simplesmente está
dizendo que, embora aceite o seu posto de apóstolos, não se sente intimidado
por suas pessoas, como acontecia com os judaizantes.[9]
O evangelho pregado por Paulo
não havia sido criado por ele nem mesmo tinha recebido dos apóstolos que vieram
antes dele, mas fora recebido do próprio Senhor Jesus. Consequentemente, sua
mensagem era a verdade do evangelho (2.5), a mensagem da “...nossa
liberdade que temos em Cristo Jesus” (2.4), a mensagem completa e imutável.[10]
ð evangelho
da incircuncisão me estava confiado (v.7) – mais bem traduzido como para o incircunciso; Paulo pregava o
evangelho primeiramente para os gentios (também para judeus, em terras gentílicas,
quando seu objetivo era ir à sinagoga primeiro – cf. At 13.5).
ð a Pedro o da
circuncisão (v.7) – o ministério de Pedro era primeiramente aos judeus.
ð aquele que
operou eficazmente em Pedro (...) esse operou também em mim (v. 8) – o
Espírito Santo, que tem apenas um evangelho, capacitou tanto Pedro como Paulo
em seus ministérios.
Portanto, Paulo passa da defesa do seu evangelho para o
alcance do seu ministério. Deus lhe deu a graça de pregar aos gentios, enquanto
deu a Pedro o privilégio de pregar aos judeus. Eles tinham ministérios
diferentes, dirigidos a públicos diferentes, mas anunciavam o mesmo evangelho
da graça.[11]
Hernandes destaca aqui dois pontos importantes: 1º) O
ministério de Paulo aos gentios era vocação divina, e não delegação humana
(v.7). Paulo não pregou aos gentios
porque deliberou fazê-lo por conta própria, nem porque Pedro ou os demais
apóstolos o comissionaram para esse mister. O mesmo Jesus que o chamou, esse
mesmo também lhe designou o campo. Sua vocação e esfera do seu ministério foram
determinados por Cristo Jesus; 2º) O
ministério de Paulo aos gentios era capacitação divina, e não treinamento
humano (2.8). O Senhor não
apenas conduziu Paulo aos gentios, mas o capacitou eficazmente para esse
trabalho, da mesma forma que fez com Pedro em relação aos judeus. O chamado
vem de Deus, assim como o poder e a capacitação para exercer o
ministério. Paulo não é apóstolo por vontade própria nem exerce o
apostolado com poder próprio. Tanto sua vocação quanto seu poder vêm de
Deus. Assim, cada um concentraria seus esforços no campo que o Espírito Santo
havia lhe designado. Tiago, Pedro e João falariam aos judeus; Paulo falaria aos
gentios.[12]
As colunas da igreja em Jerusalém, Tiago, Cefas e
João, não apenas reconheceram o apostolado de Paulo endereçado aos gentios, mas
também estenderam a ele e a Barnabé a destra de comunhão, a fim de que fossem
uns para os gentios, e outros, para a circuncisão.
Hernandes Dias, destaca aqui dois pontos. 1º) a
liderança da igreja está unida em torno do único evangelho (v.9a) – Os apóstolos de Jerusalém e
Paulo não estão em conflito, mas dando as mãos em sinal de total concordância
acerca do único evangelho a ser pregado, quer entre os gentios, quer entre os
judeus. Warren Wiersbe quando escreve: A grande preocupação de Paulo era com “a
verdade do evangelho” (G1 2.5,14), não com a “paz da igreja”. A sabedoria que
Deus envia do alto é “primeiramente pura; depois pacífica” (Tg 3.17). A “paz a
qualquer custo” não era a filosofia de ministério de Paulo, e também não deve
ser a nossa; 2º) a liderança da
igreja reconhece a diferença de ministérios (v.9b) – Os líderes da igreja de Jerusalém selaram a unidade
cristã ao darem a Paulo e a Barnabé a destra de comunhão, enquanto
rechaçavam as ideias heréticas dos judaizantes.
O fato, porém, de existir um só evangelho não
significa que o evangelho não tenha endereçamentos distintos. Enquanto Paulo e
Barnabé são enviados aos gentios, os apóstolos são enviados aos judeus. O mesmo
evangelho deve ser pregado a gentios e judeus. A mensagem é a mesma, mas a
forma é diferente. O conteúdo é o mesmo, mas a abordagem é diferente. A
teologia é a mesma, mas o método é diferente. Adolf Pohl corretamente
sintetiza: “Um novo grupo alvo da proclamação demanda diferente apresentação,
ênfase e concentração”.
Hernandes Dias vê no v.10 duas verdades: 1ª) não há conflito entre fé e obras (v.10a) – O evangelho da graça é
integral. Ele provê salvação para a alma e redenção para o corpo. É
transcendental e ao mesmo tempo assistencial; 2ª) não há conflito entre
evangelização e ação social (v.10b).
Não há conflito entre a pregação do evangelho e o cuidado dos pobres.
William Hendriksen diz que ajudar os pobres é
requerido na lei de Deus (cf. Êx 23.10,
11; 30.15; Lv 19.10; Dt 15.7-11), na exortação dos profetas (cf. Jr 22.16; Dn 4.27; Am 2.6, 7) e no
ensino de Jesus (cf. Mt 7.12; Lc 6.36, 38;
Jo 13.29). É fruto da gratidão do crente pelos benefícios recebidos.
Aqueles que recebem misericórdia tornam-se misericordiosos. Paulo diz que
aqueles que recebem benefícios espirituais devem retribuir com benefícios
materiais (cf. Rm 15.26, 27). Jesus
é o maior exemplo de generosidade (cf. 2Co
8.9). O homem generoso receberá grande recompensa (cf. Mt 25.31-40).
Concluindo – Terminemos refletindo nas palavras de Paulo aos Efésios 4.1-6.
Rodo-vos, pois, eu, o preso do Senhor, que andeis como
é digno da vocação com que fostes chamados, com
toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando-vos uns aos outros
em amor, procurando guardar a unidade do
Espírito pelo vínculo da paz. Há um só corpo e
um só Espírito, como também fostes chamados em uma só esperança da vossa
vocação; Um só Senhor, uma só fé, um só batismo; Um só
Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos e em todos vós.
[1] Lopes, Hernandes Dias. Gálatas – A carta da Liberdade
Cristã, Editora Hagnos, 2011, p. 79, 80.
[2] Lopes, p. 80.
[3] Keller, Timothy. Gálatas para você, Vida Nova, 2015,
p. 39.
[4] Lopes, p. 81-83. Este comentário segue literalmente a
exposição do livro, nas páginas já citadas, com cortes e acréscimos necessários
ao ensino local.
[5] MacArthur, John. Gálatas – A maravilhosa Graça de
Deus, Editora Cultura Cristã, 2011, p. 20.
[6] Keller, p. 44.
[7] Carson, D. A. Comentário Bíblico Vida Nova, Vida Nova,
SP, 2009, p. 1822.
[8] MacArthur, p. 20, 21. Segue literalmente o comentário
nas páginas já citadas, com cortes e acréscimos necessários ao ensino local.
[9] Lopes, p. 86.
[10] Lopes, p. 87.
[11] Lopes, p. 87, 88.
[12] Lopes, p. 88, 89.
[13] Lopes, p. 89-92. Este comentário segue literalmente a
exposição do livro, nas páginas já citadas, com cortes e acréscimos necessários
ao ensino local.
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