segunda-feira, 7 de março de 2016

Estudos Bíblicos na Carta aos Gálatas (2) - Outro Evangelho

Gálatas 1.6-10

Em nosso de introdução à carta de Paulo aos Gálatas, vimos:

ð Que àqueles que querem levar Deus a sério, a carta aos Gálatas mostra o caminho para a verdadeira liberdade. Esta liberdade genuína não é nem legalismo nem anarquismo.
ð Que Gálatas é uma explosão de alegria e liberdade que nos faz desfrutar de profundo significado, segurança e satisfação – a vida de bênçãos à qual Deus chamou o seu povo.
ð Que Gálatas tem tudo a ver com o evangelho, do qual todos necessitamos ao longo da vida inteira. É onde Paulo explica que as verdades do evangelho modificam a vida de alto a baixo; que transformam nosso coração, nosso modo de pensar e nossa abordagem de absolutamente tudo. E isso quer dizer que os cristãos necessitam tanto do evangelho como os não cristãos.
ð Que Paulo escreveu essa carta para defender a justificação pela fé e advertir essas igrejas sobre as terríveis consequências do abandono dessa doutrina essencial. E que o problema de acrescentar alguns preceitos da lei à fé como condição para a salvação é que os falsos mestres estavam atacando o coração do próprio cristianismo.
ð Que o argumento de Paulo é que acrescentar alguns preceitos da lei à fé não apenas anula a própria lei e a fé, mas também rechaça a graça de Cristo. Essa tentativa de combinar o cristianismo com o judaísmo foi chamada por Paulo de outro evangelho, e o apóstolo o condena sem rodeios, dizendo que deveria ser anátema.
ð Que Paulo se apresenta como um embaixador, apresentando suas credenciais. Seu apostolado levava o carimbo da origem divina.
ð Que sua saudação, traz à baila as verdades essenciais do evangelho: a graça e a paz. Essas duas palavras são uma síntese do evangelho. A paz fala da natureza da salvação, e graça diz respeito à sua fonte.
ð E que o evangelho bíblico, o evangelho que Paulo prega e ensina deixa claro que a salvação, do início ao fim, é obra de Deus. O chamado, o plano, a ação, a obra são todos seus. Assim, é ele que merece toda a glória, em todo o tempo.

Hoje, continuando nosso estudo, vamos ver Gálatas 1.6-10 com o tema: Outro Evangelho. Faremos isso em três pontos: 1º) O outro evangelho não é o Evangelho de Jesus Cristov.6; 2º) O outro evangelho é pervertidov.7; 3º) O outro evangelho é uma maldiçãovv.8-10.

Já vimos que Paulo defendeu o seu apostolado (1.1) e o seu evangelho (1.4). Agora, ele continua fazendo uma vigorosa defesa do evangelho (1.6-10). Isso, porque os falsos mestres, vindo do judaísmo como embaixadores do engano, perverteram o evangelho, proclamando que a fé em Cristo não era suficiente para a salvação (cf. At 15.1, 5). Eles tornavam a obra de Cristo na cruz insuficiente e acrescentavam as obras da lei como condição indispensável para a salvação.

I. O outro evangelho não é o Evangelho de Jesus Cristo – v.6

A primeira coisa que vemos aqui é que Paulo está admirado, ele está perplexo em como aqueles irmãos estão deixando se levar por um evangelho que não é o Evangelho de Cristo.[1] Ele está admirado ao ver a rapidez que esses crentes estavam apostatando da fé. Em vez de dar graças a Deus pela igreja no introito da sua carta, como de costume fazia nas outras epístolas, Paulo revela seu espanto pela inconstância e instabilidade dos gálatas. William Hendriksen diz que no tange à igreja, Paulo demonstra consternação e não indignação, assombro e não ressentimento. Ainda que Paulo os reprove, não os rechaça.[2]

Observemos o texto mais detalhadamente:[3]

...tão depressa (v.6b) – a palavra, em grego, pode significar facilmente ou rapidamente e, às vezes, os dois. Sem dúvida, ambos os sentidos caracterizavam a resposta dos gálatas à doutrina herética dos falsos mestres.

...passásseis (v.6c) – É a palavra grega usada para designar a deserção militar, a qual era punida com a morte. A forma desse verbo grego indica que os crentes gálatas estavam desertando voluntariamente da graça para seguir o legalismo ensinado pelos falsos mestres.

...daquele vos chamou (v.6d) – pode ser traduzido como que vos chamou de uma vez por todas, e refere-se à chamada para a salvação feita por Deus.

...à graça de Cristo (v.6e) – o ato de misericórdia livre e soberano de Deus ao conceder a salvação por meio da morte e ressurreição de Cristo, totalmente desvinculado de qualquer obra ou mérito humano.

...para outro evangelho (v.6f) – a perversão pelos judaizantes do verdadeiro evangelho; eles acrescentaram condições, cerimônias e padrões da antiga Aliança como pré-requisitos para a salvação.

O evangelho bíblico da graça é precioso. Paulo diz que os cristãos são chamados pela graça de Cristo. Deus nos chamou; não fomos nós que o chamamos. E Deus nos aceitou de pronto, apesar de não merecermos. Essa é a ordem do evangelho. Deus nos aceita, então o seguimos. Era esse evangelho glorioso que os líderes das igrejas da Galácia estavam pervertendo, e era dele que os membros da igreja local haviam se desviado.[4]

II. O outro evangelho é pervertido – v.7[5]

Paulo usa aqui um trocadilho de palavras para desmascarar o outro evangelho anunciado pelos judaizantes. Há duas palavras na língua grega para “outro”: heteros (outro de outra substância, diferente) e allos (outro da mesma substância). Paulo declara ironicamente que eles se voltaram para outro (heteros) evangelho, o qual não é outro (allos). O que os falsos mestres pregavam era um evangelho heteros, “de tipo diferente”, e não um evangelho allos, “do mesmo tipo”. O verdadeiro evangelho é o evangelho da graça, da salvação pela fé em Cristo. O outro evangelho, denunciado por Paulo, é o evangelho das obras, que acrescenta ao sacrifício de Cristo os ritos da lei, por exemplo a circuncisão, como condição para a salvação (cf. At 15.1).

Paulo diz que esse outro evangelho é um evangelho diferente, de outra natureza, com outro conteúdo, e não pode ser aceito como evangelho. Esse outro evangelho não passa de um falso evangelho. Concordo com John Stott quando diz que a mensagem dos falsos mestres não era um evangelho alternativo; era um evangelho pervertido.

William Hendriksen ainda esclarece esse ponto ao destacar que os gálatas estavam volvendo para um evangelho diferente, quer dizer, a um evangelho que difere radicalmente do que haviam recebido de Paulo. O evangelho de Paulo consistia em: “...o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus” (cf. 2.16; Rm 3.24; Ef 2.8; Tt 3.4-7). Warren Wiersbe diz que os judaizantes afirmavam pregar “o evangelho”, mas não é possível haver dois evangelhos, um com base nas obras e outro com base na graça. “Eles estão pregando outro evangelho”, escreve Paulo, “mas uma mensagem diferente – tão diferente do verdadeiro evangelho que, afinal, não é evangelho”.

William Hendriksen corretamente defende que os crentes gálatas não estavam se apartando meramente de uma posição teológica, mas estavam transferindo sua lealdade daquele que em sua graça e misericórdia os havia chamado. Warren Wiersbe tem razão ao argumentar que os cristãos da Galácia não estavam apenas “mudando de religião” ou “mudando de igreja”; na verdade, estavam abandonando a própria graça de Deus! Pior ainda, estavam deixando o próprio Deus da graça!

Portanto, Paulo diz que qualquer mudança no evangelho significa transformá-lo em algo que, na realidade, não é o evangelho (cf. v.7 NVI). Qualquer ensinamento que acrescente a manutenção da lei mosaica cerimonial à fé em Cristo perverte o evangelho. Literalmente, a palavra que ele escolhe usar quer dizer reverte. Assim, se for acrescentado qualquer coisa a Cristo como um requisito para ser aceito por Deus, reverte por completo a ordem do evangelho e o anula e esvazia. Qualquer revisão do evangelho o reverte.[6]

A causa meritória da salvação é a obra que Cristo fez por nós, e não a obra que fazemos para ele; e a causa instrumental da salvação é a fé, e não os rituais da lei. Qualquer mensagem que negue e torça essa verdade axial é uma perversão da mensagem cristã.

Os mestres do engano são identificados por duas ações aqui: perturbavam a igreja e pervertiam o evangelho.

Warren Wiersbe explica que o termo grego traduzido como transtornar ou perverter é usado apenas três vezes no Novo Testamento (cf. At 2.20; G1 1.7; Tg 4.9). Significa “fazer uma reviravolta, passar a seguir em direção contrária, inverter”. Em outras palavras, os judaizantes haviam invertido e virado os ensinamentos em direção contrária, levando-os de volta à lei.

III. O outro evangelho é uma maldição – vv.8-10

A razão de Paulo tratar desse assunto de forma tão enérgica é que estava em jogo tanto a glória de Cristo quanto a pureza da igreja. Na linguagem de William Hendriksen, a própria essência do evangelho corria perigo.[7]

Jonh Stott diz que há dois motivos para a indignação de Paulo: () é que a glória de Cristo estava em jogo, pois se as obras humanas são necessárias para a salvação, a obra de Cristo não foi suficiente (cf. 2.21); e () é que o bem-estar das almas das pessoas estava em jogo (cf. Mc 9.42).[8]

Nos vv.8, 9, Paulo “emprega a repetição para enfatizar suas palavras. Aqueles que distorcem o evangelho de Cristo que foi pregado por ele durante os primeiros dias da igreja na Galácia – até mesmo se tal mestre for o próprio apóstolo”[9] – que ele seja amaldiçoado.

Observemos o texto mais detalhadamente:[10]

v.8aainda que nós mesmos ou um anjo do céu – o ponto levantado por Paulo é hipotético, apelando para os exemplos mais improváveis de falsos ensinos (ele mesmo e anjos). Os gálatas não deveriam receber mensageiros, não importando quão impecáveis fossem suas credenciais, se a doutrina da salvação que eles pregavam diferisse, no mais leve grau, da verdade de Deus revelada por meio de Cristo e dos apóstolos.

v.8bseja anátema – a tradução dessa palavra grega se refere a destinar alguém à destruição no inferno eterno (cf. Rm 9.3; 1Co 12.3; 16.22). Ao longo da história, Deus destinou alguns objetos, indivíduos e grupos de pessoas à destruição (cf. Js 6.17-18; 7.1, 25-26). O Novo Testamento oferece muitos exemplos de um desses grupos: o dos falsos profetas (cf. Mt 24.24; Jo 8.44; 1Tm 1.20; Tt 1.16). Aqui, os judaizantes são identificados como membros dessa infame sociedade.

v.9acomo já vo-lo dissemos – refere-se ao que Paulo ensinou na visita feita anteriormente a essas igrejas, e não a um comentário anterior nessa epístola.

v.9bSe alguém vos anunciar Paulo passa do caso hipotético do v.8 (o apóstolo ou anjos celestiais pregando um falso evangelho) para a situação real enfrentada pelos gálatas. Os judaizantes faziam exatamente isso e deveriam ser condenados ao inferno por causa de sua heresia.

Por um lado, os falsos mestres, prometiam salvação e, por outro, impediam as pessoas de confiarem no único que é capaz de conceder a salvação. Por isso, Paulo descreve os falsos mestres como dignos de punição, pois levam consigo muitas almas para o inferno[11] (cf. Mt 24.24; Jo 8.44; 1Tm 1.20; Tt 1.16).

Hernandes Dias destaca alguns pontos importantes nos vv.8, 9: () O evangelho é maior que os apóstolos – Warren Wiersbe diz que a prova do ministério de uma pessoa não é sua popularidade (Mt 24.11), nem os sinais e prodígios miraculosos que ela realiza (Mt 24.23, 24), mas sim sua fidelidade à Palavra de Deus (Is 8.20; 1Tm 4.1-5; 1Jo 4.1-6). Adolf Pohl afirma que o evangelho transfere o cristão da área da maldição para a área da bênção, mas, por meio da apostasia, o abençoado escolhe novamente seu lugar no âmbito da maldição. Onde quer que a lei tenha uma maldição para aqueles que falham em cumpri-la, o evangelho tem uma maldição para aqueles que procuram mudá-lo; () o evangelho é maior do que os anjos; () o evangelho é maior do que os falsos mestres; e () o evangelho pregado e recebido traz bênção, mas o evangelho adulterado gera maldição.[12]

v.10[13]Os mestres judaizantes acusaram Paulo de ajustar sua mensagem de forma que fosse atraente aos homens e lhes ganhasse o favor. Mas, o propósito de Paulo não era agradar aos homens, e sim, levar a eles a mensagem da salvação.

Por isso, Paulo não se intimidou diante desse ataque. Sua resposta foi imediata. Vejamos aqui dois pontos importantes: () Paulo não negociou a verdade para procurar o favor dos homens – v.10a; e () Paulo estava a serviço de Cristo, e não dos homensv.10b.

Concluindo – Lições e aplicações:

1º) Dar ouvidos a outro evangelho significa estar se desviando daquele que o chamou para o verdadeiro evangelho (v.6); 2º) Dar ouvidos a outro evangelho significa estar ouvindo uma heresia destruidora da fé cristã (v.7); 3º) Dar ouvidos a outro evangelho significa estar em perigo de maldição (vv.8, 9).

Pr. Walter Almeida Jr.
IBL Limeira - 06/03/16





[1] Keller, Timothy. Gálatas para você, Vida Nova, 2015, p. 13.
[2] Lopes, Hernandes Dias. Gálatas – A carta da Liberdade Cristã, Editora Hagnos, 2011, p. 48.
[3] MacArthur, John. Gálatas – A maravilhosa Graça de Deus, Editora Cultura Cristã, 2011, p. 11.
[4] Keller, p. 18, 19.
[5] Lopes, p. 51-53. Este comentário segue literalmente a exposição do livro nas páginas já citadas, com cortes e acréscimos necessários ao ensino local.
[6] Keller, p. 19.
[7] Lopes, p. 54.
[8] Casimiro, Arival Dias. Estudos Bíblicos Gálatas & Tiago – Liberdade, Fé e Prática, Z3 Editora, 2011, p. 5.
[9] Kalisher, Meno. Liberdade em Cristo – Entendendo a epistola de Paulo aos Gálatas, Actual Edições, 2013, p. 43.
[10] MacArthur, p. 11. Segue literalmente o comentário nas páginas já citadas, com cortes e acréscimos necessários ao ensino local.
[11] Kalisher, p. 43.
[12] Lopes, p. 54-58.
[13] Lopes, p. 58, 59. Segue literalmente o comentário nas páginas já citadas, com cortes e acréscimos necessários ao ensino local.

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