Em
nosso estudo anterior sobre o que cremos
sobre Deus Pai, vimos:
ü
Que Deus é conhecível, mas incompreensível exaustivamente;
que Ele possui atributos comunicáveis e incomunicáveis e o Seu relacionamento
com a humanidade.
Terminamos
com as palavras do Artigos de Fé sobre Deus:[1]
Há um só
Deus vivo e verdadeiro, sendo revelado na natureza como o Criador, Preservador
e Governador Justo do universo; e nas Escrituras como Pai, Filho, e Espírito
Santo, ainda como um só Deus, infinitamente sábio e bondoso, a quem todas as
criaturas inteligentes devem supremamente amar, adorar, e obedecer.
Assim
como Picirilli, em nosso estudo de hoje, seguiremos a ordem do Manual de Fé – Seção I – Criação: do Mundo,
dos Anjos e do Homem; Seção II –
Estado Primitivo do Homem e sua Queda.[2]
Nosso
tema é O que cremos sobre a Criação e a Humanidade. Veremos esse
assunto em três pontos: 1º) Cremos
que Deus criou o mundo e tudo o que nela há; 2º) Cremos que Deus criou os seres angelicais; 3º) Cremos que Deus criou o homem.
I. Cremos que Deus criou o mundo e tudo
o que nele há – Gn 1.1; Hb 11.3.
Em
Gn 1 temos o relato da criação em
seis dias, dividido em duas partes: 1ª)
Gn 1.1-10 – Deus cria as estruturas fundamentais do nosso mundo – a) o tempo – vv.3-5; b) o espaço – vv.6-10. O espaço é delimitado verticalmente – vv.6-8, e horizontalmente
– vv.9-10; 2ª) Gn 1.11-28 – Deus cria
dentro do mundo já estruturado, os seres vivos e as condições para sua
sobrevivência – a) a criação da natureza (plantas) – vv.11-13; b) a criação do sol e da lua como marcadores do dia e da noite – vv.14-19; c) a criação dos animais – vv.20-25;
d) a criação dos seres humanos – vv.26-28. Dentro de seu plano criativo,
Deus acrescenta, ainda, providências quanto à reserva alimentar do planeta – vv.29-30, e um parecer final
registrando a satisfação do Criador com a sua criação – v.31.[3]
Deus criou o mundo, e tudo
quanto nele há, para seu próprio agrado e glória, e para usufruto de suas
criaturas.[4] (Cf. Ap 4.11; Is 43.7; 1Tm 6.17)
1. [5]A primeira parte do primeiro parágrafo afirma o fato
da criação. A palavra mundo se refere
ao universo físico ou material. Apesar da declaração ser suficientemente clara,
há alguns pontos importantes a salientar, especialmente quando se tem em vista
como as pessoas na cultura atual pensam sobre o universo físico.
a.
O universo
material não é eterno. Veio a existir
em algum momento no tempo e a atividade criadora de Deus foi responsável por
trazê-lo à existência.
b.
O universo
material não tem a capacidade de
autocriação. O poder para trazê-lo à existência e sustentá-lo não está contido
dentro do mundo. Este poder vem de fora e se encontra na vontade de Deus. (Cf. Cl 1.16, 17; Hb 1.2, 3)
c.
A doutrina
cristã afirma que Deus criou ex nihilo.
Isto significa criação “do nada”. Em
outras palavras, Deus não usou algo que já existisse quando falou e trouxe à existência o universo
físico, como nos é revelado em Gênesis 1.
Antes da atividade criativa de Deus a única coisa que existia era Ele mesmo.
Toda a matéria é dependente de Deus para a sua existência.
d.
O universo
material não é tão antigo quanto a
teoria da evolução gostaria que acreditássemos. Podemos afirmar isto com
confiança porque os cálculos dos cientistas seculares baseiam-se em
pressuposições de que todas as forças que podemos observar atualmente na
natureza foram sempre as mesmas. Porém, se Deus criou qualquer coisa que não
existia antes, como a Bíblia nos afirma, então esta força criativa não pode ser
levada em consideração nos cálculos da ciência.
Nota: Os Batistas Livres não são evolucionistas.
O mundo não se desenvolveu de
matéria sem vida para formas simples de vida até chegar às formas mais complexas
por acaso ou por mecanismos cegos de causa e efeito. Ele foi criado por atos de
Deus, como descritos em Gênesis 1 e 2.
2. A segunda parte do primeiro parágrafo indica o propósito da
criação.
a.
Deus criou o
universo físico para Seu próprio prazer e glória.
b.
Deus criou o
universo físico para o prazer e dominação do homem. O ponto de vista da
narração da criação em Gênesis 1 é
um tanto antropocêntrica – isto é,
centrada no homem. Isto é especialmente verdadeiro, por exemplo, dos versículos 14-19 quando o propósito do
sol, lua e das estrelas é explicado em termos das experiências humanas de dia,
noite e estações.
II. Cremos que Deus criou os seres
angelicais
Os anjos foram criados por
Deus, a fim de glorificá-lo e obedecerem aos seus mandamentos. Aqueles que conservaram seu estado original, Ele emprega para ministrar bênçãos aos herdeiros da salvação e para executar os seus juízos sobre o
mundo.[6]
A
Bíblia é a fonte que nos dá conhecimento correto sobre a doutrina dos anjos.
Nela temos o suficiente para sabermos quem os criou e qual a sua função. Para
Erickson, “um motivo da dificuldade do assunto é que, apesar de serem
abundantes na Bíblia as referências aos anjos, eles não são discutidos. Quando
mencionados, é sempre para nos fornecer informações complementares acerca de
Deus, do que ele faz e de como o faz”.[7]
A
principal palavra bíblica, em hebraico e, também, em grego, para anjo significa
mensageiro, e ocorre cerca de 285
vezes no texto sagrado. O ensino sobre a existência dos anjos está em, pelo menos,
34 livros da Bíblia.
Os
anjos foram criados por Deus antes da fundação do mundo e num estado de
santidade. Eles são seres espirituais que não se reproduzem segundo a sua
espécie, não morrem, são completamente distintos dos seres humanos, têm grande
poder e são em número incontável – Cf. Sl
148.2, 5; Cl 1.16; Jó 38.6, 7; Jd 6; Hb 1.14; Mc 12.25; Lc 20.36; Sl 8.4, 5;
2Pe 2.11; Hb 12.22; Dn 7.10; Ap 5.11.
Anjos
possuem personalidade, isto é, são seres pessoais. Eles possuem intelecto (1Pe 1.12), emoções (Lc2.13) e vontade (Jd 6). Tanto no
Antigo como no Novo Testamento, foi possível interagir com eles – 2Sm 14.20; Ap 22.9. São “criaturas
morais, alguns sendo caracterizados como santos (Mt 25.31; Mc 8.38; Lc 1.26; At 10.22; Ap 14.10), enquanto outros,
os que descaíram, são descritos como seres que mentem e pecam (Jo 8.44; 1Jo 3.8-10)”.[8]
A
Bíblia faz menção de anjos bons e anjos maus, também chamados de anjos eleitos e de anjos decaídos (1Tm 5.21;
2Pe 2.4; Jd 6), embora ressalte que todos os anjos foram originalmente
criados bons e santos (Gn 1.31),
tendo livre-arbítrio.[9]
Em
Colossenses 1.16, temos a menção de
uma ordem hierárquica, entre os anjos, de modo decrescente: tronos, dominações, principados e potestades.
Já em Efésios 1.21, a mesma
graduação é mencionada em ordem crescente: principados,
poderes, potestades e domínios. Essa graduação de autoridade entre os anjos
corresponde às suas diferentes funções no céu, junto ao trono de Deus, mas,
também no seu serviço na administração divina em relação ao universo e a favor
daqueles que hão de herdar salvação. (Cf. Hb
1.14)
Vou
apenas citar alguns desses tipos ou classes de anjos: 1) Serafins – São mencionados na Bíblia apenas em Isaías 6.1-3, onde aparecem ao redor do
trono de Deus, prontos para cumprirem as suas ordens; 2) Querubins – São mencionados diversas vezes na Bíblia. São os que
guardam a entrada do jardim do Éden e tem a função de revelar o poder, a
majestade e a glória de Deus – Gn 3.24;
Hb 9.5; Ez 10.20; Ap 4.6-9; Sl 99.1; 80.1; Is 37.16; Ez 1-10); 3) Arcanjos – São anjos revestidos por
Deus de autoridade sobre outros anjos – Sl
148.2; Js 5.14; Is 55.4. Dois deles tem os seus nomes revelados na Bíblia: Miguel – Dn 10.13-21; 12.1; 9.2; Ap 12.9-7; e Gabriel (por analogia) – Dn 8.16; 9.21-27;
Lc 1.11, 13, 19; 26-35. 4) Anjos ou
Anjos Comuns – são chamados de o exército celestial – 2Cr 18.18; Jó 25.3; 2Rs 6.17; Hb 1.14; 12.22.
Numerosos
anjos participaram da rebelião de Satanás contra Deus (Ez 28.12-17; Jd 6; Ap 12.9; Mt 4.10) e abandonaram o seu estado
original de graça, como servos de Deus, e assim perderam o direito à sua
posição celestial.[10] Esses
anjos maus ou decaídos são os chamados demônios que a Bíblia menciona – Mt 25.41; 2Pe 2.4; Jd 6; At 23.8, 9.
Eles têm a mesma natureza de Satanás, são imundos, violentos, mentirosos e
estão em absoluta oposição a Deus e à sua obra – Mt 12.24; Mc 5.9; 9.2-5; 1Rs 22.21, 22; Ef 6.12.
Várias verdades importantes são citadas na declaração
sucinta do Manual. Suas implicações
precisam de explicação:
1. O homem como criatura de Deus – O fato dos seres humanos serem criados por Deus
significa que não são produto da
evolução natural. Isto fica claro quando lemos o relato de Adão e Eva no seu
sentido óbvio. Não aceitamos o relato como mito.
Porém, chegamos a esta conclusão baseado em mais do que somente a leitura
de Gênesis.
a.
A Bíblia toda
pressupõe a criação direta do homem por Deus, como também, consequentemente, a
sua responsabilidade perante Ele.
b.
O relato de
Gênesis está repleto de indícios contrários à explicação dada pela evolução
para a existência da humanidade, incluindo: 1) Adão foi formado do pó da terra, não de formas inferiores de
vida; 2) O homem foi feito à imagem
de Deus – único relato disto entre todas as criaturas; 3) Quando se procurou uma ajudadora idônea para Adão, nenhuma foi
encontrada dentro do mundo animal; e 4)
A criação de Eva foi feita a partir da costela de Adão, e isto não se encaixa
com a perspectiva evolucionista.
Isto
já é o suficiente para indicar que a posição da Bíblia não tolera uma origem
puramente evolucionista para o ser humano. Isto também vale para a “evolução
teísta”.
2. O homem feito à imagem e semelhança
de Deus – Esta é uma parte importante
do relato bíblico enfatizado em Gênesis
1.26-27. Há duas questões importantes aqui:
a.
O que
significa isto? Apesar da Bíblia não explicar como o homem é “semelhante” a Deus, a figura que ela nos dá do ser
humano parece indicar pelo menos cinco elementos que estão envolvidos na imagem
de Deus. 1) O homem é um ser pessoal: possui vontade própria,
pensamento e sentimentos. Isto inclui sua autoconsciência de sua identidade
pessoal; 2) O homem é um ser espiritual: é mais do que meramente um
ser físico, como veremos mais adiante. Temos uma natureza superior capaz de se
relacionar com Deus; 3) O homem é um
ser moral: tem um sentido de certo e errado e responsabilidade para agir de
acordo com o que é certo, o que se encontra na lei de Deus; 4) O homem é um ser racional: tem a capacidade de pensar e
raciocinar; e 5) O homem é livre e tem capacidade de autodeterminação: na sua constituição
tem a capacidade de fazer escolhas que determinam suas ações e pelas quais será
responsável.
b.
A imagem de
Deus foi destruída pela queda do homem? A resposta curta é “não”. Os seres
humanos estão corrompidos. A imagem de Deus foi desfigurada, não destruída. O
homem caído ainda tem as características que acabei de descrever, apesar de
haver limitações à nossa liberdade e capacidade para sermos humanos completos,
como Deus tinha nos projetado para ser na criação. Aqui temos um problema de
depravação que será discutido mais adiante.
3. O homem com corpo e alma – O Manual
menciona “um corpo material e de uma alma pensante e racional”. Teólogos
cristãos muitas vezes divergem quanto à dicotomia
e a tricotomia. Aqueles que defendem
a dicotomia creem que o homem é um ser composto por duas partes: corpo e alma
(ou espírito). Aqueles que defendem a tricotomia creem que o homem é composto
por três partes: corpo, alma e espírito. Os batistas livres não têm uma posição
oficial quanto a esta questão. O Manual
provavelmente não foi concebido para expressar qualquer um destes pontos de
vista.
O
que o Manual pretende é nos fazer
entender que o homem é tanto físico quanto espiritual. O homem é mais do que a
matéria, mais do que apenas uma máquina e mais do que células cerebrais
reagindo aos estímulos físicos. Sim, o homem tem um corpo material e também
existe uma vida animada. Porém o homem também possui uma natureza espiritual
que pode ter um relacionamento dinâmico, pessoal e comunicativo com Deus.
4. O homem existe para glorificar a Deus – Este é o propósito para a existência do homem como
também o é para toda a criação. O Catecismo de Westminster expressa isto
dizendo que o principal objetivo do homem é glorificar a Deus.
5. O ser humano como macho e fêmea – O apêndice ao capítulo 4, que foi acrescentado em
2008 devido às ideias atuais sobre este assunto, indica a posição Batista Livre
quanto ao casamento e a sexualidade. Como em todos os assuntos, a verdade se
encontra nas Escrituras e não nas areias movediças da opinião cultural. A
declaração é clara o bastante, não necessitando de explicação mais detalhada.
Os batistas livres entendem que a Bíblia ensina que a união sexual é reservada
para o casamento e que o casamento foi ordenado por Deus para ser a união entre
um homem e uma mulher por toda a vida.
Apêndice ao capítulo 4, seção 1.[12]
Tanto as Escrituras quanto a natureza
projetada por Deus afirmam uma união de aliança por toda a vida entre um homem,
criado por Deus como macho, e uma mulher, sendo fêmea criada por Deus, em um
relacionamento de uma só carne. Esta união de uma só carne é emblemática da
união de Cristo e Sua igreja. É o contexto lindo e único do plano divino para o
relacionamento conjugal do homem e da mulher como portadores da imagem de Deus,
bem como o alicerce ordenado por Deus para a família como unidade básica da
sociedade humana. Violações desta união de uma só carne, sejam hetero ou
homossexual, pré ou extraconjugal, são uma contravenção do plano divino para a
família e para a concepção e criação de filhos, trazendo desespero espiritual,
culpa e morte aos indivíduos e as culturas.
Concluindo
Quero
concluir com a leitura e um breve comentário sobre o texto do Capitulo IV,
Sessão II do Manual:
Nossos primeiros pais, em
seu estado original, eram retos. Preferiam e desejavam naturalmente obedecer ao
seu Criador e não tinham preferência nem desejo de transgredir sua vontade[14], até que foram
influenciados e inclinados pelo tentador a desobedecerem aos mandamentos de
Deus. Antes disso, a única tendência da natureza deles era praticar a retidão.
A posteridade de Adão entrou no mundo num estado diferente, em consequência da
primeira transgressão. Os homens não possuem aquela retidão e pureza possuídas
por Adão antes da queda; não desejam obedecer a Deus, propendem para o mal[15]. Segue-se daí que
ninguém, em virtude de qualquer bondade natural ou mera obra própria, poderá
tornar-se filho de Deus[16]; mas, para serem salvos,
todos dependem da redenção efetuada mediante o sangue de Cristo, quando criados
de novo para a obediência, através da operação do Espírito[17]; estas bênçãos são
livremente providas para todo o descendente de Adão.
Pr. Walter Almeida Jr.
IBL Limeira – 15/03/15
[1] Manual de Fé e Prática dos Batistas Livres do Brasil,
4ª Edição, 2014, 3ª Parte – Artigos de Fé, p. 29.
[2] Manual de Fé e Prática dos Batistas Livres do Brasil,
4ª Edição, 2014, 2ª Parte – A Fé dos Batistas Livres, p. 12, 13.
[3] Jr., Walter Almeida. Estudo Bíblico: Panorama do Antigo
Testamento – Gênesis 1-11 (Primórdios), 2014, p. 3.
[4] Manual (2ª Parte), p. 12.
[5] Picirilli, Robert E. Estudo da Doutrina Batista Livre,
Lição 3 – O que cremos sobre a Criação e a Humanidade, p. 2, 3. Neste ponto o
estudo segue a Lição 3, Ponto I – Deus como criador de tudo que existe além de
si mesmo, adaptados a nossa realidade local e com cortes e acréscimos que
julguei necessário, nas páginas já citadas.
[6] Manual (2ª Parte), p. 12.
[7] Erickson, Millard J. Introdução à Teologia
Sistemática, Vida Nova, 2008, p. 194.
[8] Ibid., p. 195.
[9] Duarte, Pr. Mateus. Apostila de Angelologia da FEST,
Uberaba, MG, p. 26.
[10] Duarte, p. 26.
[11] Picirilli, Robert E. Estudo da Doutrina Batista Livre,
Lição 3 – O que cremos sobre a Criação e a Humanidade, p. 5-10. Neste ponto o
estudo segue a Lição 3, Ponto I e II – Deus como criador de tudo que existe
além de si mesmo e O homem nos estados original e caído, adaptados a nossa
realidade local e com cortes e acréscimos que julguei necessário, nas páginas
já citadas.
[12] Aprovado em assembleia pela Associação Nacional das
Igrejas Batistas Livres dos Estados Unidos em julho de 2008.
[13] Manual (2ª Parte), p. 12.
[15] Salmos 51.5; Romanos 8.7;
Efésios 2.3; Salmos 58.3.
[16] João 6.44; 1 Coríntios 2.14.
[17] João 3.3, 5; 1.13; Hebreus
12.14; Colossenses 1.14; Tito 3.5.
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