Atos 20.17-38
(testemunho,
ensino e recompensa)
Introdução
Sem dúvida alguma o livro de Atos dos
Apóstolos é um dos mais importantes do Novo Testamento. Seu primeiro título foi
“Atos”, depois é que foi
acrescentado “dos Apóstolos”, isso porque
a palavra grega traduzida por atos é (praxeis) “praxeis”
e era usada para descrever as realizações
de grandes homens o que, de fato, o livro de Atos dos Apóstolos faz,
retratando personagens notáveis dos primeiros anos da igreja.
É o segundo livro escrito por Lucas,
que era médico e da equipe do apóstolo Paulo, a partir de sua segunda viagem
missionária – observar as várias passagens em que aparece a expressão nós –
Atos 16.10-17; 20.5-16; 27.1-26. O próprio Paulo testifica a amizade e
companheirismo de Lucas em Colossenses 4.14; 2 Timóteo 4.11; Filemom 24. “Os
escritos dos primeiros pais da igreja, tais como Irineu, Clemente de
Alexandria, Tertuliano, Orígenes, Eusébio e Jerônimo afirmam a autoria de
Lucas, e o mesmo acontece com o Cânon Muratoriano (170 d.C.)”[1].
Lucas, além de médico, “foi
pesquisador esmerado e historiador minucioso, demonstrando conhecimento
profundo das leis e dos costumes romanos, bem como da geografia da Palestina,
da Ásia Menor e da Itália”[2]. Ao
escrever Atos, usou fontes escritas (Atos 15.23-29; 23.26-30) e entrevistas
feitas, sem dúvida, entre os apóstolos e irmãos da época – “... conforme nos
transmitiram os que desde o princípio foram deles testemunhas oculares e
ministros da palavra...” (Lucas 1.2;
Atos 1.1).
“Lucas e Atos parecem ter sido
escritos praticamente ao mesmo tempo, Lucas primeiro e Atos depois. Combinados,
eles compõem um relato em dois volumes endereçados a Teófilo, apresentando uma
história abrangente da fundação do Cristianismo, que vai do nascimento de
Cristo à prisão domiciliar de Paulo em Roma”[3].
O primeiro livro escrito por Lucas
foi o Evangelho de Jesus Cristo Segundo Lucas, que ele começa assim:
Visto que muitos houve que empreenderam uma narração
coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os
que desde o princípio foram deles testemunhas oculares e ministros da palavra,
igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde
sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem,
para que tenhas plena certeza das verdades em que foste instruído.
Lucas 1.1-4
O segundo livro, que é o que estamos
tratando, Atos dos Apóstolos, começa assim:
Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as
coisas que Jesus começou a fazer e a ensinar até ao dia em que, depois de haver
dado mandamentos por intermédio do Espírito Santo aos apóstolos que escolhera,
foi elevado às alturas.
Atos 1.1, 2
Esses dois textos sugerem o seguinte:
1º) A obra de Lucas em dois volumes narra
dois estágios do único ministério de Jesus; 2º) Atos é uma continuação dos atos e ensinos de Jesus, por meio dos
apóstolos e da Igreja e; 3º) A
ascensão de Cristo é o fato que separa os dois estágios, o qual encerra o
ministério terreno de Jesus e inicia o seu ministério celestial.
Sobre esse Teófilo sabe-se pouco,
provavelmente um alto funcionário do governo romano. Seu nome significa “amigo
de Deus”. O que observamos aqui é uma preocupação pastoral de Lucas pelo “bem
estar espiritual de Teófilo, que precisava de mais instrução sobre a pessoa, o
ensino e a obra de Jesus”[4].
Segundo Arival Dias Casimiro, além de
outros propósitos que podem ser apresentados, o livro tem dois propósitos
relacionados a missões: 1º) O de motivar
o crescimento da igreja e; 2º) o de oferecer
aos cristãos um manual de missões[5].
Esse livro, além de seu valor
histórico, “tem um valor teológico e prático permanentes para os cristãos de
todas as épocas”[6].
Se observarmos os princípios contidos
no livro de Atos, entenderemos “que a obra de Deus é feita pelo poder de Deus,
com os recursos de Deus e dentro da metodologia de Deus”[7].
John MacArthur diz que “Atos é
pródigo em transições: do ministério de Jesus para o ministério dos apóstolos;
da antiga aliança para a nova aliança; de Israel como nação para a Igreja
(composta tanto de judeus quanto de gentios) como povo testemunha de Deus”[8].
Para Carlos Osvaldo, “Atos talvez
seja o melhor exemplo no Novo Testamento da multiplicidade de propósitos de uma
obra”[9]. Seus
propósitos sejam eles, apologéticos, teológicos ou didáticos, são enfatizados pelos
estudiosos de acordo com sua abordagem específica.
“O tema central do livro de Atos é o
progresso da mensagem do Reino das ruas estreitas de Jerusalém no começo da
década de a.D. 30 às colinas abafadas de Roma no verão de a.D. 60. Este livro
trata das forças, humanas e sobrenaturais, que permitiram que o Evangelho de
Jesus Cristo atingisse o centro do Império Romano em menos de uma geração”[10].
Atos dos Apóstolos tem sido esboçado
de diversas maneiras com fins pedagógicos. Um esboço que gosto de usar e
sugerir, com algumas adaptações, é o de Carlos Osvaldo, que fez uma opção “por
uma divisão do livro em duas partes, observando os seus limites
racial-geográficos, com os doze primeiros capítulos tratando do crescimento do
evangelho no mundo judaico ou palestiniano, e os últimos dezesseis descrevendo
o mesmo fenômeno no mundo gentílico”[11].
Assim, os pontos principais do esboço
do livro seriam:
1º) A mensagem soberana do reino proclamada no
mundo judaico – 1.1-12.24
2º) A mensagem soberana do reino proclamada no
mundo gentílico – 12.25-28.31
O texto que lemos e que vamos expor, rapidamente,
hoje, está dentro do segundo ponto do esboço principal do livro. Olhemos agora
o capítulo 20 de Atos:
Primeiro – 20.1-3 – Fala sobre o ministério de
Paulo na Macedônia e na Acaia, que segue sua estratégia de confirmar igrejas
previamente estabelecidas e fazê-las participar de seus planos.
20.1, 2a – Paulo encorajou os crentes na Macedônia;
20.2b-3a – Paulo permaneceu em Corinto por três meses;
20.3b – Uma tentativa judaica de assassinar Paulo, o que
fez com que ele decidisse iniciar a viagem para Jerusalém por terra, e não por
mar.
Segundo – 20.4-38 – Temos a descrição do ministério de Paulo a caminho de Jerusalém
destacando a sua autoridade apostólica e a sua dedicação à orientação que
recebera do Senhor.
20.4, 5 – Os seus companheiros na viagem eram
representantes de diversas igrejas regionais, que estavam encarregados de levar
o dinheiro das ofertas para os pobres da Judéia.
20.6-13 – O ministério de Paulo em Trôade revela seu poder
apostólico e seu compromisso com a edificação dos irmãos.
20.14-35 – O ministério de Paulo aos presbíteros da igreja
de Éfeso, em Mileto, revela sua filosofia de ministério e sua preocupação com o
bem-estar espiritual da igreja.
20.14-16 – Paulo convocou os presbíteros a Mileto para não
correr o risco de demorar em Éfeso.
20.17-21 – Ele faz uma recapitulação de sua filosofia de
ministério durante seu tempo em Éfeso.
20.22-24 – Ele reafirma o seu compromisso em fazer a
vontade de Deus ao viajar para Jerusalém sob a direção do Espírito Santo.
20.25-27 – Ele recorda a abrangência de seu ensino como a
base para sua paz de espírito quanto ao destino espiritual de seus ouvintes.
20.28-31 – Ele aconselha aos presbíteros a se apoiarem e se
ajudarem mutuamente, e a protegerem a igreja, como pastores, com muito cuidado
por causa do possível surgimento futuras de heresias.
20.32-35 – Ele encomenda os presbíteros à graça de Deus
com uma exortação a um ministério autossustentado e sacrificial.
20.36-38 – E, por fim, temos a calorosa despedida dos
presbíteros e Paulo, e um contraste entre essa manifestação afetuosa e as intenções
assassinas dos judeus em relação a sua pessoa.
Bem,
que lições poderemos aprender deste texto sobre o ministério de Paulo? Creio
que três lições importantes estão claras aqui para nós, hoje: 1º) A lição do testemunho no ministério cristão;
2º) A lição do ensino no ministério
cristão; e 3º) A lição da recompensa
do ministério cristão.
I. A lição do testemunho no ministério
cristão – vs. 18-21
Quem
foi e quem se tornou Paulo? Em Atos 22.1-15 temos uma síntese de sua vida!
C.E.
Macartney escreve:
"O mais amargo inimigo tornou-se o maior amigo. A
mão que escrevia a acusação dos discípulos de Cristo, levando-os à presença dos
magistrados e para a prisão, agora escrevia epístolas do amor redentor de Deus.
O coração que bateu de júbilo quando Estevão caiu sobre as pedras sangrentas,
agora se regozijava em açoites e apedrejamentos por amor de Cristo. Do outrora
inimigo, perseguidor, blasfemador proveio a maior parte do Novo Testamento, as
mais nobres declarações de teologia, os
mais doces poemas de amor cristão" (J.O. Sanders, p.28).
Em
que consistiu o testemunho de Paulo em Éfeso?
1. v.18 – em seu procedimento piedoso – “... Vós bem sabeis
como foi que me conduzi entre vós em todo o tempo...”
2. v.19a – em humildade – “... servindo ao Senhor com toda a
humildade...”
3. v.19b – em quebrantamento – “... lágrimas e provações...”
4. vs.20 – verbalmente
(na pregação e no ensino) – “... jamais deixando de vos anunciar coisa alguma
proveitosa e de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa...”
O procedimento piedoso, a humildade, o quebrantamento
diante das provações e o testemunho verbal na pregação e ensino de Paulo tinham
um objetivo comum: testificar “... tanto a judeus como a gregos o
arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo”. (v.21)
II. A lição do ensino no ministério
cristão – v.20, 22-27
Paulo
é claro aqui: “... jamais deixando de vos anunciar coisa alguma proveitosa e de
vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa...” (v.20).
Temos
aqui duas coisas importantes feita por Paulo: 1ª) ... jamais deixando de vos
anunciar coisa alguma proveitosa... – isto é, a pregação da mensagem da cruz ou o plano da salvação; e 2ª) ... e
de vo-la ensinar publicamente e também de casa em casa... – ou seja, o ensino
sistemático da mensagem da cruz e suas implicações ou doutrina para crescimento
e edificação.
Jesus
em seu ministério, comunicou aos seus discípulos e aqueles que comissionou para
apóstolos, um pacote completo de ensinamentos e ordenou-lhes expressamente que
ensinassem todas as coisas que eles tinham aprendido com ele. Escute as
palavras de Jesus: (Mateus 28.19, 20)
Ide, portanto, fazei
discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e
do Espírito Santo; ensinando-os a
guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco
todos os dias até à consumação do século.
Paulo
fez justamente isso, escute o que ele disse no v.27 – “... jamais deixei de vos
anunciar todo o desígnio de Deus.”
v.22, 23 – Por isso ele, Paulo, estava tranquilo para
continuar sua viagem, mesmo sabendo que as circunstancias e o que o esperava
era um tempo de tribulação.
Escute
sua declaração de clássica de filosofia de ministério – v.24: Porém em nada considero
a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o
ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de
Deus.
Qual
era o objetivo do ministério didático de Paulo? “... o ministério que recebi do
Senhor Jesus para testemunhar o
evangelho da graça de Deus. Portanto, eu vos protesto, no dia de hoje, que
estou limpo do sangue de todos; porque jamais deixei de vos anunciar todo o desígnio de Deus”. (vv.24b, 26,
27)
John
MacArthur diz que ... todo o desígnio de Deus... foi “todo o plano e propósito
de Deus para a salvação do ser humano nos mínimos detalhes: as verdades divinas
da criação, eleição, redenção, justificação, adoção, conversão, santificação,
vida santa e glorificação”[12].
III. A lição da recompensa no ministério
cristão – vv. 28-35
1. vv.28-31 – temos aqui, da parte de Paulo, uma advertência
oportuna, que se provou correta por acontecimento posteriores em Éfeso – 1Tm
1.3-7; 19-20; 6.20-21. Falsos mestres já estavam, realmente, atuando nas
igrejas da Galácia e Corinto – Gl 1.6; 2Co 11.4.
a. v.28 – Atendei por vós e por todo o rebanho sobre o qual o
Espírito Santo vos constituiu bispos, para pastoreardes a igreja de Deus, a
qual ele comprou com o seu próprio sangue.
Atendei – um
chamado a auto avaliação do ministério. A ênfase aqui está na responsabilidade
dos líderes de vigiarem e protegerem a igreja, não uma comunidade qualquer, mas
a igreja de Deus, a qual ele comprou com
o seu próprio sangue.
b. v.31 – Portanto, vigiai, lembrando-vos de que, por três
anos, noite e dia, não cessei de admoestar, com lágrimas, a cada um.
Paulo, agora, diz
lembrem-se de como foi meu modo de vigiar e proteger a igreja de Deus ... por três anos, noite e dia, não cessei de
admoestar, com lágrimas, a cada um.
2. vv.32-35 – Paulo, agora, fala da recompensa ministerial de quem
recebeu o chamado para servir ao Senhor
com toda a humildade, lágrimas e provações... ... jamais deixando de anunciar
coisa alguma proveitosa e de ensinar publicamente e também de casa em casa, testificando
o arrependimento para com Deus e a fé em nosso Senhor Jesus Cristo. Em nada considerando a vida preciosa para si
mesmo, contanto que complete a carreira e o ministério que recebeu do Senhor
Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus. Pregando o reino. Jamais deixando de anunciar todo o desígnio de Deus.
No tempo que for necessário, noite e dia, não cessando de admoestar, com
lagrimas, a cada um. (vv.19-21, 24,
25, 27)
a.
Que recompensa?
1ª)
Edificação pela palavra da graça de Deus – v.32a
2ª)
Herança entre todos os que são santificados – v.32b
3ª)
Bem-aventurança da doação – dar – v.35
Escute
o que Paulo disse em 2 Timóteo 4.6-8:
Quanto
a mim, estou sendo já oferecido por libação, e o tempo da minha partida é
chegado. Combati o bom combate, completei a carreira, guardei a fé. Já agora a
coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, reto juiz, me dará naquele
Dia; e não somente a mim, mas também a todos quantos amam a sua vinda.
Concluindo – vv.36-38 – Vamos orar!
Vamos orar para
que a lição do testemunho, do ensino e da recompensa do ministério de Paulo e
dos pastores de Éfeso, seja uma realidade em nossos ministérios hoje!
O
texto diz (36-38)
Tendo dito estas coisas, ajoelhando-se, orou com todos eles. Então, houve
grande pranto entre todos, e, abraçando afetuosamente a Paulo, o beijavam, entristecidos
especialmente pela palavra que ele dissera: que não mais veriam o seu rosto.
E acompanharam-no até ao navio.
Pr. Walter Almeida Jr.
CBL Limeira - SP
[1]
John MacArthur, Bíblia de Estudo MacArthur, SBB, 2010, p. 1433.
[2] Ibid., p. 1433.
[3] Ibid., p. 1315
[4]
Arival Dias Casimiro, Plante Igrejas, p. 18.
[5] Ibid., p. 21.
[6] Ibid., p. 17.
[7] Ibid., p. 8
[8]
MacArthur, p. 1434.
[9]
Carlos Osvaldo Cardoso Pinto, Foco e Desenvolvimento no Novo Testamento,
Hagnos, 2008, p. 188.
[10]
Ibid., p. 191.
[11]
Ibid., p. 191
[12] MacArthur, p. 1473.
Nenhum comentário:
Postar um comentário