Hebreus 1.5-2.4
Em
nosso estudo de introdução à Carta aos Hebreus vimos:
ð
Que a Carta aos
Hebreus foi escrita com o propósito de encorajar os cristãos perseguidos por causa
da sua fé no início do cristianismo.
ð
Que os destinatários
originais eram judeus convertidos que estavam sofrendo agressões físicas e o
roubo de seus bens materiais (Hb 10.32-34).
ð
Que o autor de
Hebreus exorta aos cristãos a permanecerem na fé cristã, sendo fiéis ao ensino
do Evangelho (Hb 13.22), pois as
consequências da apostasia são irreversíveis e horríveis (Hb 6.4-8; 10.31).
ð
Que o estudo da
Carta aos Hebreus é relevante, para nós hoje, pelo menos por três razões: Por sua relevância teológica, por sua relevância pastoral e por sua relevância apologética.
ð
Que o tema da
carta é “A superioridade de Cristo”, e em seu esboço, a carta, mostra como esse
“tema é desenvolvido ao provar que Jesus
Cristo é superior tanto em sua pessoa quanto em seu sacerdócio”.
Estudamos,
também, os vv.1-4 do capítulo 1, com
o seguinte tema: Jesus Cristo é a Revelação Superior.
Definimos
revelação como o ato de Deus comunicar a
sua existência e a sua vontade aos homens. E que Deus se revela de quatro
maneiras: através da criação, na consciência dos homens, pela Bíblia e por intermédio de Jesus.
Hoje,
vamos estudar Hb 1.5-2.4 com o tema:
Jesus é superior aos anjos.
Uma
coisa que observamos na carta aos Hebreus é o equilíbrio entre ensino e
exortação. Do capítulo 1.1 ao 10.18 os textos são principalmente ensinamentos.
Do 10.19 até o final do livro o texto é principalmente de exortação.[1]
Vendo
a carta por esse ângulo do equilíbrio entre o ensino e a exortação, vamos
estudar o texto, de hoje, vendo (1) seu ensino sobre a superioridade de Jesus em
relação aos anjos e (2) a admoestação que isso nos traz.
I. Ensino – Jesus é melhor e superior aos anjos – 1.5-14
A
principal palavra bíblica, em hebraico e, também, em grego, para anjo significa
mensageiro, e ocorre cerca de 285
vezes no texto sagrado. O ensino sobre a existência dos anjos está em, pelo
menos, 34 livros da Bíblia.
Os
anjos foram criados por Deus antes da fundação do mundo e num estado de
santidade. Eles são seres espirituais que não se reproduzem segundo a sua
espécie, não morrem, são completamente distintos dos seres humanos, têm grande
poder e são em número incontável – Cf. Sl
148.2, 5; Cl 1.16; Jó 38.6, 7; Jd 6; Hb 1.14; Mc 12.25; Lc 20.36; Sl 8.4, 5;
2Pe 2.11; Hb 12.22; Dn 7.10; Ap 5.11.
Anjos
possuem personalidade, isto é, são seres pessoais. Eles possuem intelecto (1Pe 1.12), emoções (Lc2.13) e vontade (Jd 6). Tanto no
Antigo como no Novo Testamento, foi possível interagir com eles – 2Sm 14.20; Ap 22.9. São “criaturas
morais, alguns sendo caracterizados como santos (Mt 25.31; Mc 8.38; Lc 1.26; At 10.22; Ap 14.10), enquanto outros,
os que descaíram, são descritos como seres que mentem e pecam (Jo 8.44; 1Jo 3.8-10)”.[2]
A
Bíblia faz menção de anjos bons e anjos maus, também chamados de anjos eleitos e de anjos decaídos (1Tm 5.21;
2Pe 2.4; Jd 6), embora ressalte que todos os anjos foram originalmente
criados bons e santos (Gn 1.31),
tendo livre-arbítrio.[3]
O
povo judeu em sua religião dava muita importância aos anjos, pelo fato de que a
Lei foi entregue a Moisés por esses seres espirituais – cf. Dt 33.2; At 7.53; Gl 3.19. Alguns, por
isso, chagaram ao absurdo de praticarem culto aos anjos – cf. Cl 2.18.
Portanto,
foi necessário que o escritor demonstrasse que Cristo, o centro do Evangelho, é
maior que os anjos. Se não fosse assim, ele não seria capaz de persuadi-los a
permanecerem fiéis a Jesus em vez de voltar ao judaísmo.
O
argumento do escritor teve grande força para os seus leitores originais,
porque, ele, citou sete versículos das suas Escrituras, o Antigo Testamento,
sendo um deles em 2Samuel e os outros nos Salmos. Usando esses textos, ele,
destaca quatro pontos, todos combinados para destacar seu ponto central que Jesus Cristo é melhor que os anjos, sendo
em muito superior a eles.[4]
1. Os anjos são apenas anjos –
Jesus Cristo é o Filho de Deus – v.5
As
citações do Antigo Testamento desse argumento são 2Sm 7.14 e Sl 2.7,
textos que atestam a identidade de Jesus
como o Filho de Deus desde a eternidade. Importante observar que o Salmo é
citado na primeira parte do v.5 e 2Sm na segunda parte, e ambos fazem
referência ao relacionamento entre a primeira e a segunda pessoa da Trindade.
Isso nunca é feito em relação aos anjos.
Apesar
de os anjos serem chamados coletivamente de filhos de Deus, somente Jesus é o
Filho exclusivo Dele – Jó 1.6; Hb 1.5.
Assim como os seres humanos, os anjos são chamados filhos de Deus por criação,
pois em algum momento da criação eles tiveram inicio (Gn 1.1), e embora estejam exaltados na presença de Deus, eles não
são filhos nem herdeiros de Deus (Rm
8.17).[5]
2. Os anjos são apenas adoradores – Jesus Cristo é o adorado – v.6.
O
v.6 apresenta Cristo como o
primogênito. Aquele que é o herdeiro designado de um Deus que não pode morrer!
Por isso, nesse contexto, o termo se refere à eterna divindade de Cristo como o
Filho de Deus.[6]
A
citação do AT é do Salmo 97.7,
referente ao Hino de Moisés em Dt 32 (v.43). O termo deuses no Salmo e nações
em Deuteronômio se refere aos anjos e a todas as criaturas naturais ou
sobrenaturais como os deuses pagão, produzidos pela mente humana pecadora. (Sl 96.5)
Os
anjos são adoradores do primogênito de Deus – Rm 8.29; Cl 1.15, 18. Eles estão ao redor do trono, mas não estão
assentados no trono[7]
– Ap 5.11-13. Em Isaías 6, o profeta os viu fazendo
exatamente isso.[8]
(cf. Jo 12.41)
3. Os anjos são apenas criaturas – Jesus
Cristo é o Criador – vv.7-12.
O
v.7 cita o Salmo 104.4 onde há dois conceitos, ambos demonstrando que os anjos
são seres inferiores e subordinados a Deus.
Os
vv.8, 9 citam o Salmo 45.6, 7, um salmo messiânico com duas ênfases sobre a pessoa
de Cristo: 1ª) Ele é o Rei divino
que reinará eternamente com excelência e estabilidade; e 2ª) Ele é o Messias, o ungido de Deus, para trazer salvação, cura,
consolo, e libertação aos pecadores (cf.
Is 61.1-3; Lc 4.18, 19).
Os
vv.10-12 citam o Salmo 102.25-27, onde “Cristo é tratado pelo
nome divino de Senhor e visto como o Criador, aquele que permanece imutável em
meio a todas as coisas que mudam. Esses versículos abrangem toda a história,
mostrando que Cristo existia antes da criação (e é, portanto, desde a
eternidade), realizou toda a criação, permanecerá quando toda a criação findar
e continuará a existir para sempre.”[9] A
comparação feita aqui é entre o Criador, Jesus, e a criação, os anjos. Não dá
para comparar!?
4. Os anjos são apenas servos –
Jesus Cristo é Rei – vv.13, 14.
O
v.13 cita o Salmo 110.1, outro salmo messiânico, que apresenta Cristo assentado
à direita de Deus, enquanto aguarda o triunfo final sobre seus inimigos. Jesus
Cristo está à direita de Deus reinando soberanamente, todas as coisas estão
sujeitas a Ele, pois é Senhor! (cf. At
2.36; Ef 1.21; Cl 2.10; 1Pe 3.22).
O
v.14 é claro sobre a função dos
anjos: ... enviados para servir a favor daqueles que
hão de herdar a salvação? Antes de servirem os que herdarão a salvação, eles servem a Jesus. Eles
anunciaram a sua concepção, o seu nascimento, a sua ressurreição, a sua
ascensão e a sua segunda vinda – cf. Mt
1.20, 21; Lc 2.8-20; Mt 28.5-7; At 1.11. Os anjos, também, o serviram
durante o seu ministério terreno e executarão os seus propósitos nos fins dos
tempos – cf. Mt 4.11; Lc 22.43; Mt
13.41; 24.30, 31. Eles o teriam tirado da cruz se fossem ordenados por Ele
– Mt 26.53.
Portanto,
observando as sete citações selecionadas do Antigo Testamento usadas pelo
escritor de Hebreus, nota-se uma progressão. “Elas tratam do eterno
relacionamento de Cristo com o Pai, sua vinda ao mundo, sua unção por Deus e
seu reinado. Nós o vemos criando e consumando o mundo, assentado e reinando
para sempre sobre seus inimigos. Sete nos fala de perfeição. Acabamos de ler um
atestado de realeza. Que são os anjos em relação a Ele?”[10]
II. Exortação – 2.1-4 – convém-nos atentar
com mais diligência
Como já
vimos, o ensino e a exortação fazem parte da estrutura da carta aos Hebreus.
Por isso, em meio ao ensino bíblico e teológico da carta, há cinco exortações
práticas e diretas: 1ª) Não nos desviemos da Palavra – 2.1-4; 2ª) Não endureçamos o coração
à Palavra – 3.7-4.13; 3ª) Não
sejamos morosos em ouvir a Palavra – 5.11-6.20;
4ª) Não sejamos obstinados à Palavra – 10.26-39; e 5ª) Não recusemos a Palavra – 10.25-29.
Nessa
primeira admoestação da carta, somos exortados:
1. A
apegarmo-nos ao conteúdo da Palavra – v.1.
A expressão portanto
liga a exortação com aquilo que foi dito anteriormente no primeiro capítulo –
... convém-nos atentar com mais diligência para as coisas que já
temos ouvido...
(v.1a). E o que eles tinham ouvido
era o puro e simples Evangelho de Jesus Cristo. Deus falou, de maneira final e
definitiva, por meio do seu Filho! A consequência do desapego à Palavra de Deus
é o desvio da fé
– ... para que em tempo algum nos
desviemos delas. (v.1b) Um crente desatento pode
naufragar ou se destruir espiritualmente. (cf. 1Tm 1.19)
2. A apegarmo-nos a autoridade da Palavra – v.2, 3.
a. v.2 – Três coisas a observar: 1ª) A
palavra fala pelos anjos – refere-se a Lei de Deus dada por mãos dos anjos
– Dt 5.22; At 7.35-53; Gl 3.19; 2ª) Essa Lei permaneceu firme, isto é, valida ou com autoridade para baixar
penalidade caso fosse quebrada ou ignorada; 3ª) Toda transgressão à essa Lei recebeu a justa punição. Portanto, como escaparemos nós se
negligenciarmos o Evangelho dado pelas mãos do Filho de Deus?
b. v.3a – Quatro lições na pergunta:
Como escaparemos nós, se não atentarmos para
uma tão grande salvação? 1ª) Só
há uma salvação e ela é de Deus – Sl
3.8; Jn 2.9; 2Tm 1.9; At 4.2; 16.31; 2ª)
A salvação é grande em todos os sentidos,
por isso a expressão tão grande salvação; 3ª) Essa tão grande salvação pode ser negligenciada – a expressão se não atentarmos significa negligenciar, desconsiderar, desprezar,
desvalorizar e não importar-se com (cf. Mt 22.1; 1Tm 4.14; Hb 8.9). Outra forma de negligenciar o evangelho
é não crer no seu conteúdo (cf. Is 5.24);
4ª) A punição é certa para o negligente. Qual a resposta à pergunta:
Não escaparemos! Se a transgressão da Lei do Antigo Testamento gerou juízo
imediato de Deus, imaginem o severo julgamento de Deus sobre aqueles que
desprezarem o evangelho da graça[11] (cf. Mt 10.14, 15; Lc 12.47).
3. A
apegarmo-nos ao poder da Palavra – v.3, 4.
Três lições da grandiosa salvação que é a
manifestação do poder de Deus, por meio da pregação da Palavra: 1ª) Ela
é poderosa em sua origem – v.3b
– ... começando a ser anunciada pelo
Senhor... (cf. Mc 1.14, 15; Jo 3.32);
2ª) Ela é poderosa em sua transmissão e recepção – v.3c, 4a – ... confirmada pelos que a ouviram; Testificando também Deus com eles, por sinais, e milagres,
e várias maravilhas... (cf. At 4.29-31; Rm 10.17);
3ª) Ela é poderosa em sua distribuição – v.4b – ... e dons do Espírito Santo,
distribuídos por sua vontade? É o Espírito Santo que de
forma diversa e soberana presenteia o homem com a salvação.[12] O termo
distribuir do grego merismoi, significa atribuir, conceder ou conferir
(cf. Rm 12.3; 1Co 7.17)
Concluindo – Uma pequena reflexão final nas palavras de Stuart Olyott:
“É a
própria grandeza do Evangelho que tornar a apostasia um perigo. Dar as costas a
qualquer outro sistema de crença é simplesmente afastar-se de uma ideia humana.
Mas com o evangelho não é assim. Não se trata apenas de uma ideia entre muitas.
Deus falou! Sua palavra final à humanidade se encerra em seu Filho. Veja que é
o Filho. Não há ninguém maior que ele.
Dar as
costas ao evangelho é desprezar a maior pessoa do universo – o seu Criador,
Juiz, aquele que pisará sobre todos os seus inimigos, o único em quem há
salvação, porque, em si mesmo, ele fez a purificação de nossos pecados.
Neste
ponto da carta, cada um de nós precisa fazer uma pausa para considerar como é a
nossa relação com Cristo. Estou de fato ligado a ele? Se estiver, minha ligação
com ele é mais forte ou mais fraca do que foi no passado?”[13]
Pr. Walter Almeida Jr.
IBL Limeira – 09/08/15
[1] Olyott, Stuart. A Carta aos Hebreus bem explicadinha,
Editora Cultura Cristã, 2012, p. 12.
[2] Erickson, Millard J. Introdução à Teologia
Sistemática, Vida Nova, 2008, p. 195.
[3] Duarte, Pr. Mateus. Apostila de Angelologia da FEST,
Uberaba, MG, p. 26.
[4] Olyott, p. 20.
[5] Casimiro, Arival Dias. Revista Exposição Bíblica –
Estudos Expositivos na Carta aos Hebreus, Z3 Editora, 2013, 3ª Lição, p. 11
[6] Olyott, p. 20.
[7] Casimiro, p. 12.
[8] Olyott, p. 20.
[9] Ibid., p.21.
[10] Olyott, p. 22.
[11] Casimiro, p. 14, 15.
[12] Ibid., p. 15.
[13] Olyott, p. 23, 24.
Gosto muito de ler, aprender e ensinar quando me deparo com estudos como este que são bem explicados. Parabéns aprendi muitas coisas.
ResponderExcluirGosto muito de ler, aprender e ensinar quando me deparo com estudos como este que são bem explicados. Parabéns aprendi muitas coisas.
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