domingo, 30 de agosto de 2015

Estudos Bíblicos na Carta aos Hebreus (4) - O perigo da apostasia e o descanso prometido

Hebreus 3-4

Em nosso estudo anterior sobre a humanidade perfeita de Jesus Cristo, fizemos a seguinte pergunta: Por que Jesus Cristo precisou se tornar homem? Respondemos:

ð 1º) Para cumprir o mandato que Deus entregou a Adãovv.5-8; 2º) Para ser o autor da salvaçãovv.10-13; 3º) Para destruir o poder do Diabo a da mortevv.14, 15; e 4º) Para socorrer os filhos de Deusvv.16-18.

ð Terminamos afirmando que a humanidade de Jesus é uma das verdades centrais da nossa fé e do cristianismo. Sem ela, a expiação de Cristo seria ineficaz em todos os seus aspectos. O sacerdócio de Jesus seria uma farsa e a sua obra de intercessão uma mentira. Jesus Cristo homem é o fundamento da obra de mediação, 1Tm 2.5 diz: Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem.

Hamilton Smith diz que “os dois primeiros capítulos nos revelam as glórias da pessoa de Cristo, preparando-nos dessa maneira para compreendermos a imensurável bênção que resulta do Seu Ministério como o grande Sumo Sacerdote.”[1]

Já temos visto que os irmãos “hebreus estavam considerando seriamente desistir de seu compromisso com o Evangelho de Cristo para voltar ao judaísmo praticado anteriormente.”[2] Essa carta é, justamente, para persuadi-los a pensar diferente. O autor já fez isso nos dois primeiros capítulos onde provou a superioridade da revelação e da pessoa de nosso Senhor Jesus Cristo. Agora, ele passa a mostrar-lhes o perigo da apostasia e a bênção da perseverança.

Hoje, vamos estudar Hb 3-4 com o tema: O perigo da apostasia e o descanso prometido.

I. O Perigo da Apostasia – 3.1-19

Inicialmente o autor reconhece que os seus leitores originais são crentes verdadeiros e revela três detalhes sobre eles (v.1): 1º) Eles são irmãosv.1apessoas que integram a família de Deus (Hb 10.19); 2º) Eles são santosv.1bpessoas que foram santificadas por Cristo (Hb 2.11); 3º) Eles são participantes da vocação celestialv.1cpessoas que receberam o chamado do Evangelho e o receberam pela fé (2Tm 1.9, 10).

Esse privilégio de ser chamado por Deus, pelo seu Evangelho, traz consigo responsabilidades: considerai a Jesus Cristo, apóstolo e sumo sacerdote da nossa confissão. (v.1d)

Stuart Olyott parafraseando essa passagem (v.1) escreve: “À luz do que acabo de dizer, considerem a Cristo Jesus. Fixem nele os seus pensamentos – poderem, estudem, meditem em Jesus.”[3] Aqueles irmãos deveriam prestar mais atenção, observar mais, fixar os olhos espirituais em Jesus Cristo. Eles deveriam olhar para Jesus de dois modos: 1º) como Apóstolo da nossa confissão – ele foi enviado por Deus para ser a revelação definitiva do seu caráter e da sua vontade (Jo 3.17; 8.42; 17.3; 1Jo 4.10); e 2º) como Sumo Sacerdote da nossa confissão – ele foi constituído por Deus como nosso intercessor diante dele, isto é, ele tornou possível um relacionamento com Deus (Hb 2.17; Rm 8.34; 1Co 12.3). Por isso, “ele é o centro e o conteúdo da nossa confissão”.[4] O objetivo desse ensino era encorajar os cansados, desafiar os preguiçosos e desobedientes e reanimar os que estão duvidando e se afastando da fé do evangelho (Fp 1.27).

Creio que, para o autor, um crente genuíno vê e segue Jesus como o Apóstolo e Sumo Sacerdote da sua confissão, por outro lado, se alguém afirma ser um crente verdadeiro e não vê Jesus dessa forma, está correndo o perigo de se tornar um apostata, ou seja, voltar para sua religião anterior, no caso o judaísmo.

Assim sendo, ele, apresenta três contrastes entre Moisés e Jesus, para mostra que Jesus é quem deve ser seguido e é ele que está diante de Deus por nós – vv.2-6: 1º) Moisés fazia parte da casa, era um membro da família, Jesus é o Criador da casav.3 (Hb 11.2, 25); 2º) Moisés era homem e Jesus é Deusv.4; 3º) Moisés foi um servo na casa de Deus, Jesus é o Filho de Deus em sua própria casav.5, 6.

Muito pouco se tem dito sobre a apostasia atualmente, talvez por que esse assunto assusta alguns crentes, ou por conta do discurso liberal de que não podemos fazer julgamentos, ou mesmo porque a apostasia tem se tornado comum no meio cristão contemporâneo e muitos não querem admitir o fato. Uma coisa é certa, sempre que o assunto é mencionado, muitos entendimentos equivocados surgem.

Para o texto que estamos estudando, apostar é não ficar firme em Cristo e seu evangelho até o final (vv.6, 14). É afastar-se do Deus vivo (v.12). Como resultado, a pessoa não é mais reconhecida como pertencendo a Cristo e deixa de entrar no descanso prometido a todos que lhe pertencem (v.6b, 14; 4.1).[5]

A apostasia começa no coração, ou seja, nos afetos e pensamentos, no interior da pessoa (v.8, 10b, 12, 15). Os passos que levam a apostasia são: 1º) O coração se torna endurecido diante da Palavra de Deus; recusa-se a acatá-la (v.8, 13, 15), porque, com toda franqueza, o pecado parece ser mais atraente (v.13b); 2º) Em seguida, vem a provocação – murmuração, insatisfação, reclamação e rebeldia (v.8, 16). Isso conduz ao pecado, ou seja, fazer aquilo que é proibido, não sem querer, mas com desejo ativo (v.7); 3º) Isso leva a incredulidade (v.12, 18). A palavra usada no grego dá a ideia de rebeldia obstinada e desobediência causada pela descrença. Quando isso acontece, o afastamento final do Senhor já ocorreu. Tudo o que resta são as admoestações da Palavra de Deus que, como nós sabemos, não são ameaças vazias (v.10, 11, 18, 19; 4.1).[6]

Arival Dias Casimiro vê no texto seis estratégias para combater a dureza de coração que leva a apostasia:[7] 1ª) Ouvir e submeter-se a autoridade das Escriturasv.7, 8, 13, 15; 1Pe 1.21; Sl 95.7, 8; 2ª) Aprender com os erros dos outrosv.7-11; Sl 95.8-11; Êx 17; 1Co 10.11; 3ª) Guardar o coração contra o pecadov.8, 10, 12, 15; Mc 7.21, 22; Pv 4.23; Sl 51.10. A incredulidade é uma doença do coração, pois todo pecado brota do coração. A incredulidade é o pior e mais perverso dos pecados, pois todo pecado vem dela (v.12); 4ª) Procurar conhecer os caminhos de Deus, ou seja, a sua vontade em sua Palavra – v.10; Is 55.8, 9; Rm 12.1, 2; 5ª) Praticar o encorajamento (exortação) mutuo na comunidade onde estamos inseridosv.13. Sobre o encorajamento, três observações: (1) é para todos os crentes, (2) é uma necessidade diária e (3) é necessário por causa do engano do pecado; 6ª) Guardar a nossa fé com firmeza e confiançav.14; Fp 1.6. A evidência de que estamos unidos a Cristo é a nossa perseverança em confiar em Deus, apesar das circunstancias (Hb 11.1).

Para Olyott, evita-se a apostasia primeiramente pelo reconhecimento de que nenhuma pessoa que professa ser crente entrará no céu se não perseverar na fé até o fim. Talvez isso não se ajuste ao entendimento teológico de alguns, mas é uma verdade bíblica – v.6, 14. Todos os que professam seguir a Cristo devem reconhecer que não estão isentos de apostatar, pois o uso das palavras qualquer e nenhum nos vv.12, 13 ressalta justamente isso (4.1).[8]

Deus não tornou difícil para nós a perseverança. Se mantivermos em vista o líder da nossa fé, seguindo-o de perto, chegaremos com segurança ao céu e gozaremos o descanso eterno que nos prometeu.
Stuart Olyott

II. O descanso prometido – 4.1-16

(continua na próxima semana)


[1] Smith, Hamilton. Estudos sobre a Epístola aso Hebreus, Deposito de Literatura Cristã, 2008, p. 31.
[2] Olyott, Stuart. A Carta aos Hebreus bem explicadinha, Editora Cultura Cristã, 2012, p. 31.
[3] Olyott, p. 31.
[4] Casimiro, Arival Dias. Revista Exposição Bíblica – Estudos Expositivos na Carta aos Hebreus, Z3 Editora, 2013, 5ª Lição, p. 21.
[5] Olyott, p. 35, 36.
[6] Ibid., p. 36.
[7] Casimiro, p. 23, 24.
[8] Olyott, p. 36.

domingo, 16 de agosto de 2015

Estudos Bíblicos na Carta aos Hebreus (3) - A humanidade perfeita de Jesus Cristo

Hebreus 2.5-18

Em nosso estudo anterior:

ð Vimos que Jesus é melhor e superior aos anjos pelas seguintes razões: 1) Os anjos são apenas anjos – Jesus Cristo é o Filho de Deus – v.5; 2) Os anjos são apenas adoradores – Jesus Cristo é o adorado – v.6; 3) Os anjos são apenas criaturas – Jesus Cristo é o Criador – vv.7-12; 4) Os anjos são apenas servos – Jesus Cristo é Rei – vv.13, 14.

ð Vimos, também, a exortação do autor para: (1) apegarmo-nos ao conteúdo da Palavra – v.1; (2) apegarmo-nos a autoridade da Palavra – vv.2, 3; e (3) apegarmo-nos ao poder da Palavra – vv.3, 4.

Hoje, vamos estudar Hb 2.5-18 com o tema: A humanidade perfeita de Jesus Cristo.

Stuart Olyott falando sobre esse texto diz: “Que passagem tremenda! Ela mostra que o Senhor Jesus Cristo tornou-se Filho do Homem para que pudéssemos ser filhos de Deus. Ele veio à terra para que pudéssemos ser participantes de sua justiça. Tomou a nossa natureza para que pudéssemos ter a sua. Tornou-se homem a fim de restaurar-nos tudo o que havíamos perdido na queda de Adão.”[1]

Na mentalidade judaica, influenciada pelo gnosticismo, quando Jesus se tornou homem, tornou-se menor que os anjos e não poderia ser perfeito como Deus nem como homem. Sabendo disso, o escritor, passa a demonstrar que Jesus Cristo é perfeito como Deus, pelo fato de ser Deus, e perfeito como homem.

Assim ele faz duas argumentações teológicas e práticas: 1ª) nos vv.5-13 ele mostra que a superioridade de Jesus Cristo não é cancelada por ele ter vindo entre nós como homem; e 2ª) nos vv.14-18 mostra que a superioridade de Jesus Cristo não é cancelada por ele ter sofrido por nós como homem.[2]

Nosso foco, hoje, é sobre a humanidade de Jesus Cristo. Por isso, quero trabalhar o texto respondendo uma pergunta que, creio, é muito importante e deveria estar na mente dos irmãos a quem a carta aos hebreus foi escrita e na nossa também: Por que Jesus Cristo precisou se tornar homem?

Vamos responder em quatro pontos: 1º) Para cumprir o mandato que Deus entregou a Adão – vv.5-8; 2º) Para ser o autor da salvação – vv.10-13; 3º) Para destruir o poder do Diabo a da morte – vv.14, 15; e 4º) Para socorrer os filhos de Deus – vv.16-18.[3]

I. Para cumprir o mandato que Deus entregou a Adão – vv.5-8

A argumentação começa com a citação do Salmo 8 deixando claro que o homem foi criado por Deus com o mandato de dominar a terra (Gn 1.26-28). Mas por conta do pecado de Adão, toda a raça humana se tornou pecadora e o homem perdeu a sua capacidade de domínio e possessão, e tornou-se um escravo do pecado (Gn 3.17-19).

Mas, Jesus, ao assumir a natureza humana, cumpriu o ideal do homem perfeito estabelecido por Deus – v.9. Aqui podemos aprender quatro lições da humanidade de Jesus: 1ª) O período de sua humanidade ou encarnação foi limitado ao prazo suficiente para a realização da sua obrav.9a; 2ª) A intenção da sua humanidade foi morrer e salvar a humanidadev.9b; 3ª) Por que se humanizou todas as coisas, nos céus e na terra, estão sob a sua autoridadevv.8, 9a (Mt 28.18; Ef 1.22; At 2.36; Fp 2.9-11); 4ª) A graça de Deus é a causa da sua humanidadev.9c (2Co 8.9; Ef 2.5-8).

A causa da redenção era o amor infinito de Deus para conosco,
pelo qual ele não poupou seu próprio Filho.
Arival Dias Casimiro

II. Para ser o autor da salvação – vv.10-13

“Convinha de forma soberana a Deus, como aquele que criou todas as coisas para os seus próprios propósitos, conduzir muitos filhos à gloria”[4], isto é, salvar todos aqueles alcançados por sua graça, mediante a fé – ... trazendo muitos filhos à glória... (v.10a; Ef 2.8).

Aqui no v.10 Jesus é apresentado como o Príncipe (autor na ARA) da salvação deles. A palavra usada aqui para príncipe ou autor significa pioneiro, originador, fundador (Hb 5.9; 12.2; At 3.15; 5.31). Jesus realizou algo singular a favor da humanidade (v.9) e de maneira justa é chamado de autor da salvação eterna (5.9). Para o autor, “Jesus é em alguns aspectos o líder qua agiu como alguém que desbravou a trilha, abrindo assim o caminho para que outros o seguissem”[5] (Cf. 6.20; 12.1-3). Assim, ele não somente abriu o caminho, mas lidera os salvos por meio do seu exemplo (Hb 12.2). Jesus é o alicerce sobre a qual a salvação é garantida.

A obra de Jesus realizada para a salvação é descrita de duas maneiras: 1ª) v.10bconsagração (aperfeiçoasse na ARA) – isto é, “os sofrimentos de Jesus o qualificaram para ser a causa da salvação eterna”[6] (5.9; 10.14). “Não há aspecto algum em que ele fosse moralmente imperfeito, mas pelo seu sofrimento e tentação, sua morte e exaltação celestial, foi qualificado ou tornado completamente adequado como o salvador do seu povo”[7]; 2ª) v.11 santificação – assim, como o Salvador Perfeito, Jesus, santifica um povo para Deus (10.10, 14, 29; 13.12). Ele é quem os separa para a salvação. A igreja é a comunidade dos santificados (separados) em Cristo, que são chamados para serem santos (1Co 1.2).

Hebreus usa três citações do Antigo Testamento para provar isso: 1ª) Salmo 22 – um salmo messiânico onde está claro que o Messias vê a todos do povo de Deus como sendo irmãos; 2ª) Isaías 8.17 – vê o Messias (Cristo) vindouro como colocando sua confiança em Deus, provando assim tanto a sua humanidade quanto a sua identificação com seus irmãos; e 3ª) Isaías 8.18 – uma citação muito adequada para descrever o que o Senhor Jesus Cristo diz a respeito de seu povo no céu.[8]

Aqui os crentes aperfeiçoados e santificados são identificados de três maneiras: 1ª) como irmãosv.11; 2ª) como adoradoresv.12; e 3ª) como filhosv.13.

III. Para destruir o poder do Diabo a da morte – vv.14, 15

Aqui temos definido o supremo propósito de Jesus Cristo assumir a forma humana - ... para que pela morte aniquilasse o que tinha o império da morte, isto é, o diabov.14.

O autor afirma que o propósito da humanidade perfeita de Jesus foi libertar o seu povo dos seus inimigos – a morte e o diabo. Em outras palavras, no Evangelho está escrito: E dará à luz um filho e chamarás o seu nome Jesus; porque ele salvará o seu povo dos seus pecados. (Mt 1.21). João, em sua primeira carta, afirma: Quem comete o pecado é do diabo; porque o diabo peca desde o princípio. Para isto o Filho de Deus se manifestou: para desfazer as obras do diabo. (1Jo 3.8)

Portanto, Jesus, por sua humanidade perfeita, trouxe libertação completa para todos os que creem – v.15 (cf. Ef 1.3; Cl 1.13; Ef 2.1-4; Jo 8.32, 36).

Temos três lições importantes aqui: 1ª) A identificação perfeita de Jesus Cristo com a humanidade (Fp 2.5-11); 2ª) A escravidão em que vive a humanidade perdida – do diabo e do pavor da morte; e 3ª) A libertação completa realizada por meio do sacrifício de Jesus destruiu o poder do Diabo que detinha o poder da morte (cf. Rm 5.12; Cl 2.15; 1Co 15.54).

IV. Para socorrer os seres humanos – vv.16-18

Finalizando sua argumentação, o autor, afirma, categoricamente, que Jesus veio para salvar os seres humanos, pois ele assumiu a natureza humana para, por ela, salvá-la – v.16 (cf. Jo 1.10-14; Rm 8.1-4). Os verdadeiros filhos de Abraão são aqueles que vivem espiritualmente em Cristo (cf. Rm 4.16, 17; Gl 3.18, 19).

Stuart Olyott parafraseando o v.16 esclarece essa verdade: Para obter tal vitória, Jesus não se tornou anjo e, sim, descendente de Abração – judeu. Foi assim que ele realizou a obra. O ponto evidente é que ele não socorre a anjos, mas aos seres humanos.[9] João Calvino disse sobre isso: “Ele nos preferiu aos anjos, não devido a nossa excelência, mas a nossa miséria”.[10]

Temos aqui, nos vv.17, 18, três lições de Jesus como o sumo sacerdote:

1ª) Seu caráter – Ele é misericordioso e fiel – “Ao participar da natureza humana, Cristo demonstrou sua misericórdia para com a humanidade e sua fidelidade a Deus para satisfazer a exigência divina por causa do pecado e obter assim, o perdão total para o seu povo” (Cf. 1Jo 2.2; 4.10)[11]. Jesus é fiel ao cumprir as suas obrigações sacerdotais e é confiável naquilo que diz e promete – Hb 10.23.

2ª) Suas funções – sacrificar e interceder – Como sumo sacerdote que faz expiação por seu povo, Jesus fez expiação por nós sacrificando-se e derramando o seu próprio sangue. Assim, os nossos pecados foram imputados a Jesus e ele morreu em nosso lugar (Is 53.6, 12; 2Co 5.21). Como sumo sacerdote que intercede pelo seu povo, Jesus é o nosso intercessor junto ao Pai – Rm 8.34.

3ª) Sua empatia e disposição – Na sua humanidade, Jesus conheceu o sofrimento humano e a tentação, mas não foi abatido nem pelo sofrimento nem derrotado pela tentação – ... ele nunca cedeu a elas nem pecou. (4.15 BV)

Concluindo

A humanidade de Jesus é uma das verdades centrais da nossa fé e do cristianismo. Sem ela, a expiação de Cristo seria ineficaz em todos os seus aspectos. O sacerdócio de Jesus seria uma farsa e a sua obra de intercessão uma mentira. Jesus Cristo homem é o fundamento da obra de mediação, 1Tm 2.5 diz: Porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem. E o apostolo João declara que aqueles que negam a humanidade de Jesus são enganadores e anticristos (1Jo 4.2; 2Jo v.7).[12]

Quero concluir com a leitura de Hebreus 4.14-16:

Visto que temos um grande sumo sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a nossa confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém, um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno.


Pr. Walter Almeida Jr.
IBL Limeira 15/08/2015



[1] Olyott, Stuart. A Carta aos Hebreus bem explicadinha, Editora Cultura Cristã, 2012, p. 25.
[2] Ibid., p. 26.
[3] Casimiro, Arival Dias. Revista Exposição Bíblica – Estudos Expositivos na Carta aos Hebreus, Z3 Editora, 2013, 4ª Lição, p. 16-20. (O estudo segue a Lição 4 – Jesus Cristo é o Homem Perfeito, adaptados a nossa realidade local e com cortes e acréscimos que julguei necessário, nas páginas já citadas).
[4] Carson, D. A. Comentário Bíblico Vida Nova, Vida Nova, SP, 2009, p. 1992.
[5] Ibid., p. 1992.
[6] Ryrie, Charles C. Bíblia de Estudo Anotada Expandida, Mundo Cristão e SBB, SP, 2007, p. 1200.
[7] Carson, p. 1992.
[8] Olyott, p. 28.
[9] Olyott, p. 29.
[10] Casimiro, p. 19.
[11] MacArthur, John. Bíblia de Estudo MacArthur, SBB, 2010, p. 1691.
[12] Casimiro, p. 20.

sábado, 8 de agosto de 2015

Estudos Bíblicos na Carta aos Hebreus (2) - Jesus Cristo é superior aos Anjos

Hebreus 1.5-2.4

Em nosso estudo de introdução à Carta aos Hebreus vimos:

ð Que a Carta aos Hebreus foi escrita com o propósito de encorajar os cristãos perseguidos por causa da sua fé no início do cristianismo.
ð Que os destinatários originais eram judeus convertidos que estavam sofrendo agressões físicas e o roubo de seus bens materiais (Hb 10.32-34).
ð Que o autor de Hebreus exorta aos cristãos a permanecerem na fé cristã, sendo fiéis ao ensino do Evangelho (Hb 13.22), pois as consequências da apostasia são irreversíveis e horríveis (Hb 6.4-8; 10.31).
ð Que o estudo da Carta aos Hebreus é relevante, para nós hoje, pelo menos por três razões: Por sua relevância teológica, por sua relevância pastoral e por sua relevância apologética.
ð Que o tema da carta é “A superioridade de Cristo”, e em seu esboço, a carta, mostra como esse “tema é desenvolvido ao provar que Jesus Cristo é superior tanto em sua pessoa quanto em seu sacerdócio”.

Estudamos, também, os vv.1-4 do capítulo 1, com o seguinte tema: Jesus Cristo é a Revelação Superior.

Definimos revelação como o ato de Deus comunicar a sua existência e a sua vontade aos homens. E que Deus se revela de quatro maneiras: através da criação, na consciência dos homens, pela Bíblia e por intermédio de Jesus.

Hoje, vamos estudar Hb 1.5-2.4 com o tema: Jesus é superior aos anjos.

Uma coisa que observamos na carta aos Hebreus é o equilíbrio entre ensino e exortação. Do capítulo 1.1 ao 10.18 os textos são principalmente ensinamentos. Do 10.19 até o final do livro o texto é principalmente de exortação.[1]

Vendo a carta por esse ângulo do equilíbrio entre o ensino e a exortação, vamos estudar o texto, de hoje, vendo (1) seu ensino sobre a superioridade de Jesus em relação aos anjos e (2) a admoestação que isso nos traz.

I. Ensino – Jesus é melhor e superior aos anjos – 1.5-14

A principal palavra bíblica, em hebraico e, também, em grego, para anjo significa mensageiro, e ocorre cerca de 285 vezes no texto sagrado. O ensino sobre a existência dos anjos está em, pelo menos, 34 livros da Bíblia.

Os anjos foram criados por Deus antes da fundação do mundo e num estado de santidade. Eles são seres espirituais que não se reproduzem segundo a sua espécie, não morrem, são completamente distintos dos seres humanos, têm grande poder e são em número incontável – Cf. Sl 148.2, 5; Cl 1.16; Jó 38.6, 7; Jd 6; Hb 1.14; Mc 12.25; Lc 20.36; Sl 8.4, 5; 2Pe 2.11; Hb 12.22; Dn 7.10; Ap 5.11.

Anjos possuem personalidade, isto é, são seres pessoais. Eles possuem intelecto (1Pe 1.12), emoções (Lc2.13) e vontade (Jd 6). Tanto no Antigo como no Novo Testamento, foi possível interagir com eles – 2Sm 14.20; Ap 22.9. São “criaturas morais, alguns sendo caracterizados como santos (Mt 25.31; Mc 8.38; Lc 1.26; At 10.22; Ap 14.10), enquanto outros, os que descaíram, são descritos como seres que mentem e pecam (Jo 8.44; 1Jo 3.8-10)”.[2]

A Bíblia faz menção de anjos bons e anjos maus, também chamados de anjos eleitos e de anjos decaídos (1Tm 5.21; 2Pe 2.4; Jd 6), embora ressalte que todos os anjos foram originalmente criados bons e santos (Gn 1.31), tendo livre-arbítrio.[3]

O povo judeu em sua religião dava muita importância aos anjos, pelo fato de que a Lei foi entregue a Moisés por esses seres espirituais – cf. Dt 33.2; At 7.53; Gl 3.19. Alguns, por isso, chagaram ao absurdo de praticarem culto aos anjos – cf. Cl 2.18.

Portanto, foi necessário que o escritor demonstrasse que Cristo, o centro do Evangelho, é maior que os anjos. Se não fosse assim, ele não seria capaz de persuadi-los a permanecerem fiéis a Jesus em vez de voltar ao judaísmo.

O argumento do escritor teve grande força para os seus leitores originais, porque, ele, citou sete versículos das suas Escrituras, o Antigo Testamento, sendo um deles em 2Samuel e os outros nos Salmos. Usando esses textos, ele, destaca quatro pontos, todos combinados para destacar seu ponto central que Jesus Cristo é melhor que os anjos, sendo em muito superior a eles.[4]

1. Os anjos são apenas anjos – Jesus Cristo é o Filho de Deus – v.5

As citações do Antigo Testamento desse argumento são 2Sm 7.14 e Sl 2.7, textos que  atestam a identidade de Jesus como o Filho de Deus desde a eternidade. Importante observar que o Salmo é citado na primeira parte do v.5 e 2Sm na segunda parte, e ambos fazem referência ao relacionamento entre a primeira e a segunda pessoa da Trindade. Isso nunca é feito em relação aos anjos.

Apesar de os anjos serem chamados coletivamente de filhos de Deus, somente Jesus é o Filho exclusivo Dele – Jó 1.6; Hb 1.5. Assim como os seres humanos, os anjos são chamados filhos de Deus por criação, pois em algum momento da criação eles tiveram inicio (Gn 1.1), e embora estejam exaltados na presença de Deus, eles não são filhos nem herdeiros de Deus (Rm 8.17).[5]

2. Os anjos são apenas adoradores – Jesus Cristo é o adorado – v.6.

O v.6 apresenta Cristo como o primogênito. Aquele que é o herdeiro designado de um Deus que não pode morrer! Por isso, nesse contexto, o termo se refere à eterna divindade de Cristo como o Filho de Deus.[6]

A citação do AT é do Salmo 97.7, referente ao Hino de Moisés em Dt 32 (v.43). O termo deuses no Salmo e nações em Deuteronômio se refere aos anjos e a todas as criaturas naturais ou sobrenaturais como os deuses pagão, produzidos pela mente humana pecadora. (Sl 96.5)

Os anjos são adoradores do primogênito de Deus – Rm 8.29; Cl 1.15, 18. Eles estão ao redor do trono, mas não estão assentados no trono[7]Ap 5.11-13. Em Isaías 6, o profeta os viu fazendo exatamente isso.[8] (cf. Jo 12.41)

3. Os anjos são apenas criaturas – Jesus Cristo é o Criador – vv.7-12.

O v.7 cita o Salmo 104.4 onde há dois conceitos, ambos demonstrando que os anjos são seres inferiores e subordinados a Deus.

Os vv.8, 9 citam o Salmo 45.6, 7, um salmo messiânico com duas ênfases sobre a pessoa de Cristo: 1ª) Ele é o Rei divino que reinará eternamente com excelência e estabilidade; e 2ª) Ele é o Messias, o ungido de Deus, para trazer salvação, cura, consolo,  e libertação aos pecadores (cf. Is 61.1-3; Lc 4.18, 19).

Os vv.10-12 citam o Salmo 102.25-27, onde “Cristo é tratado pelo nome divino de Senhor e visto como o Criador, aquele que permanece imutável em meio a todas as coisas que mudam. Esses versículos abrangem toda a história, mostrando que Cristo existia antes da criação (e é, portanto, desde a eternidade), realizou toda a criação, permanecerá quando toda a criação findar e continuará a existir para sempre.”[9] A comparação feita aqui é entre o Criador, Jesus, e a criação, os anjos. Não dá para comparar!?

4. Os anjos são apenas servos – Jesus Cristo é Rei – vv.13, 14.

O v.13 cita o Salmo 110.1, outro salmo messiânico, que apresenta Cristo assentado à direita de Deus, enquanto aguarda o triunfo final sobre seus inimigos. Jesus Cristo está à direita de Deus reinando soberanamente, todas as coisas estão sujeitas a Ele, pois é Senhor! (cf. At 2.36; Ef 1.21; Cl 2.10; 1Pe 3.22).

O v.14 é claro sobre a função dos anjos: ... enviados para servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação? Antes de servirem os que herdarão a salvação, eles servem a Jesus. Eles anunciaram a sua concepção, o seu nascimento, a sua ressurreição, a sua ascensão e a sua segunda vinda – cf. Mt 1.20, 21; Lc 2.8-20; Mt 28.5-7; At 1.11. Os anjos, também, o serviram durante o seu ministério terreno e executarão os seus propósitos nos fins dos tempos – cf. Mt 4.11; Lc 22.43; Mt 13.41; 24.30, 31. Eles o teriam tirado da cruz se fossem ordenados por Ele – Mt 26.53.

Portanto, observando as sete citações selecionadas do Antigo Testamento usadas pelo escritor de Hebreus, nota-se uma progressão. “Elas tratam do eterno relacionamento de Cristo com o Pai, sua vinda ao mundo, sua unção por Deus e seu reinado. Nós o vemos criando e consumando o mundo, assentado e reinando para sempre sobre seus inimigos. Sete nos fala de perfeição. Acabamos de ler um atestado de realeza. Que são os anjos em relação a Ele?”[10]

II. Exortação – 2.1-4 – convém-nos atentar com mais diligência

Como já vimos, o ensino e a exortação fazem parte da estrutura da carta aos Hebreus. Por isso, em meio ao ensino bíblico e teológico da carta, há cinco exortações práticas e diretas: 1ª) Não nos desviemos da Palavra2.1-4; 2ª) Não endureçamos o coração à Palavra3.7-4.13; 3ª) Não sejamos morosos em ouvir a Palavra5.11-6.20; 4ª) Não sejamos obstinados à Palavra10.26-39; e 5ª) Não recusemos a Palavra10.25-29.

Nessa primeira admoestação da carta, somos exortados:

1. A apegarmo-nos ao conteúdo da Palavra – v.1.

A expressão portanto liga a exortação com aquilo que foi dito anteriormente no primeiro capítulo – ... convém-nos atentar com mais diligência para as coisas que temos ouvido... (v.1a). E o que eles tinham ouvido era o puro e simples Evangelho de Jesus Cristo. Deus falou, de maneira final e definitiva, por meio do seu Filho! A consequência do desapego à Palavra de Deus é o desvio da fé – ... para que em tempo algum nos desviemos delas. (v.1b) Um crente desatento pode naufragar ou se destruir espiritualmente. (cf. 1Tm 1.19)

2. A apegarmo-nos a autoridade da Palavra – v.2, 3.

a.    v.2Três coisas a observar: 1ª) A palavra fala pelos anjos – refere-se a Lei de Deus dada por mãos dos anjos – Dt 5.22; At 7.35-53; Gl 3.19; 2ª) Essa Lei permaneceu firme, isto é, valida ou com autoridade para baixar penalidade caso fosse quebrada ou ignorada; 3ª) Toda transgressão à essa Lei recebeu a justa punição. Portanto, como escaparemos nós se negligenciarmos o Evangelho dado pelas mãos do Filho de Deus?

b.   v.3aQuatro lições na pergunta: Como escaparemos nós, se não atentarmos para uma tão grande salvação? 1ª) Só há uma salvação e ela é de DeusSl 3.8; Jn 2.9; 2Tm 1.9; At 4.2; 16.31; 2ª) A salvação é grande em todos os sentidos, por isso a expressão tão grande salvação; 3ª) Essa tão grande salvação pode ser negligenciada – a expressão se não atentarmos significa negligenciar, desconsiderar, desprezar, desvalorizar e não importar-se com (cf. Mt 22.1; 1Tm 4.14; Hb 8.9). Outra forma de negligenciar o evangelho é não crer no seu conteúdo (cf. Is 5.24); 4ª) A punição é certa para o negligente. Qual a resposta à pergunta: Não escaparemos! Se a transgressão da Lei do Antigo Testamento gerou juízo imediato de Deus, imaginem o severo julgamento de Deus sobre aqueles que desprezarem o evangelho da graça[11] (cf. Mt 10.14, 15; Lc 12.47).

3. A apegarmo-nos ao poder da Palavra – v.3, 4.

Três lições da grandiosa salvação que é a manifestação do poder de Deus, por meio da pregação da Palavra: 1ª) Ela é poderosa em sua origemv.3b – ... começando a ser anunciada pelo Senhor... (cf. Mc 1.14, 15; Jo 3.32); 2ª) Ela é poderosa em sua transmissão e recepçãov.3c, 4a – ... confirmada pelos que a ouviram; Testificando também Deus com eles, por sinais, e milagres, e várias maravilhas... (cf. At 4.29-31; Rm 10.17); 3ª) Ela é poderosa em sua distribuiçãov.4b – ... e dons do Espírito Santo, distribuídos por sua vontade? É o Espírito Santo que de forma diversa e soberana presenteia o homem com a salvação.[12] O termo distribuir do grego merismoi, significa atribuir, conceder ou conferir (cf. Rm 12.3; 1Co 7.17)

Concluindo – Uma pequena reflexão final nas palavras de Stuart Olyott:

“É a própria grandeza do Evangelho que tornar a apostasia um perigo. Dar as costas a qualquer outro sistema de crença é simplesmente afastar-se de uma ideia humana. Mas com o evangelho não é assim. Não se trata apenas de uma ideia entre muitas. Deus falou! Sua palavra final à humanidade se encerra em seu Filho. Veja que é o Filho. Não há ninguém maior que ele.

Dar as costas ao evangelho é desprezar a maior pessoa do universo – o seu Criador, Juiz, aquele que pisará sobre todos os seus inimigos, o único em quem há salvação, porque, em si mesmo, ele fez a purificação de nossos pecados.

Neste ponto da carta, cada um de nós precisa fazer uma pausa para considerar como é a nossa relação com Cristo. Estou de fato ligado a ele? Se estiver, minha ligação com ele é mais forte ou mais fraca do que foi no passado?”[13]


Pr. Walter Almeida Jr.
IBL Limeira – 09/08/15




[1] Olyott, Stuart. A Carta aos Hebreus bem explicadinha, Editora Cultura Cristã, 2012, p. 12.
[2] Erickson, Millard J. Introdução à Teologia Sistemática, Vida Nova, 2008, p. 195.
[3] Duarte, Pr. Mateus. Apostila de Angelologia da FEST, Uberaba, MG, p. 26.
[4] Olyott, p. 20.
[5] Casimiro, Arival Dias. Revista Exposição Bíblica – Estudos Expositivos na Carta aos Hebreus, Z3 Editora, 2013, 3ª Lição, p. 11
[6] Olyott, p. 20.
[7] Casimiro, p. 12.
[8] Olyott, p. 20.
[9] Ibid., p.21.
[10] Olyott, p. 22.
[11] Casimiro, p. 14, 15.
[12] Ibid., p. 15.
[13] Olyott, p. 23, 24.