Introdução ao Estudo e Esboço do Livro de
Atos dos Apóstolos
Introdução
Sem
dúvida alguma o livro de Atos dos Apóstolos é um dos mais importantes do Novo
Testamento. Seu título nos manuscritos gregos existentes é “Atos”. Depois é que foi acrescentado “dos Apóstolos”, porque a palavra grega
traduzida por atos é (praxeis) “praxeis” e era usada para descrever as realizações de grandes homens que, de
fato, o livro de Atos dos Apóstolos faz, retratando personagens notáveis dos
primeiros anos da igreja.
É o
segundo livro escrito por Lucas, que era médico e da equipe do apóstolo Paulo,
a partir de sua segunda viagem missionária – observar as várias passagens em
que aparece a expressão nós – Atos 16.10-17; 20.5-16; 27.1-26. O próprio Paulo
testifica a amizade e companheirismo de Lucas em Colossenses 4.14; 2 Timóteo
4.11; Filemom 24. “Os escritos dos primeiros pais da igreja, tais como Irineu,
Clemente de Alexandria, Tertuliano, Orígenes, Eusébio e Jerônimo afirmam a
autoria de Lucas, e o mesmo acontece com o Cânon Muratoriano (170 d.C.)”[1].
Lucas,
além de médico, “foi pesquisador esmerado e historiador minucioso, demonstrando
conhecimento profundo das leis e dos costumes romanos, bem como da geografia da
Palestina, da Ásia Menor e da Itália”[2]. Ao escrever Atos, usou fontes escritas (Atos
15.23-29; 23.26-30) e entrevistas feitas, sem dúvida, entre os apóstolos e
irmãos da época – “... conforme nos transmitiram os que desde o princípio foram
deles testemunhas oculares e ministros da palavra...” (Lucas 1.2; Atos 1.1).
“Lucas
e Atos parecem ter sido escritos praticamente ao mesmo tempo, Lucas primeiro e
Atos depois. Combinados, eles compõem um relato em dois volumes endereçados a
Teófilo, apresentando uma história abrangente da fundação do Cristianismo, que
vai do nascimento de Cristo à prisão domiciliar de Paulo em Roma”[3].
O
primeiro livro escrito por Lucas foi o Evangelho de Jesus Cristo Segundo Lucas,
que ele começa assim:
Visto que muitos
houve que empreenderam uma narração coordenada dos fatos que entre nós se
realizaram, conforme nos transmitiram os que desde o princípio foram deles
testemunhas oculares e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem,
depois de acurada investigação
de tudo desde sua origem, dar-te por escrito,
excelentíssimo Teófilo,
uma exposição em ordem, para que tenhas plena certeza das verdades
em que
foste instruído.
Lucas 1.1-4
O
segundo livro, que é o que estamos tratando, Atos dos Apóstolos, começa assim:
Escrevi o primeiro
livro, ó Teófilo, relatando todas as coisas que Jesus começou a fazer e a
ensinar até ao dia em que, depois de haver dado mandamentos por intermédio do
Espírito Santo
aos apóstolos que escolhera, foi elevado às alturas.
Atos 1.1, 2
Esses
dois textos sugerem o seguinte: 1º) A
obra de Lucas em dois volumes narra dois estágios do único ministério de Jesus;
2º) Atos é uma continuação dos atos e
ensinos de Jesus, por meio dos apóstolos e da Igreja e; 3º) A ascensão de Cristo é o fato que separa os
dois estágios, o qual encerra o ministério terreno de Jesus e inicia o seu
ministério celestial.
Atos
foi escrito em Roma e antes do ano 70 d.C., provavelmente, entre 60 e 69 d.C.
“Essa data é a explicação mais natural para o final abrupto do livro, que deixa
Paulo esperando ser julgado perante César”[4]. O silêncio do autor, Lucas, sobre acontecimentos
históricos importantes para o cristianismo, como o martírio de Tiago (62 d.C.
de acordo com o historiador Josefo), a perseguição sob Nero (64 d.C.) e a
destruição de Jerusalém (70 d.C.) também sugerem que Atos foi escrito antes
desses acontecimentos.
Sobre
esse Teófilo sabe-se pouco, provavelmente um alto funcionário do governo
romano. Seu nome significa “amigo de Deus”. O que observamos aqui é uma
preocupação pastoral de Lucas pelo “bem estar espiritual de Teófilo, que
precisava de mais instrução sobre a pessoa, o ensino e a obra de Jesus”[5].
Os
comentaristas ou teólogos apresentam várias opiniões acerca do objetivo ou
propósito de Lucas ao escrever Atos. “Logo muitas possibilidades são
levantadas, até mesmo a de Lucas não ter um propósito principal, mas, vários
propósitos secundários”[6].
Walter
L. Liefeld apresenta seis teorias: 1ª) Prover à igreja um registro de seus
inícios; 2ª) Manter um relato cuidadoso para trazer certeza quanto à fé; 3ª)
Demonstrar um propósito evangelístico; 4ª) Estabelecer um valor apologético;
5ª) Trazer a resolução de questões teológicas como, por exemplo, a identidade
do povo de Deus e; 6ª) Prover um paradigma para o evangelismo cristão, as
missões e a vida da igreja[7].
Em seu
comentário, William Barclay, afirma que Lucas escreveu Atos dos Apóstolos com
três propósitos: 1º) Recomendar o
cristianismo ao governo romano, mostrando que os cristãos eram bons
cidadãos; 2º) Demonstrar que o
cristianismo era uma religião universal para todos os homens de todas as
nações. Lucas queria provar que Deus não faz acepção de pessoas, pois o
evangelho era para todos, independentemente da raça, classe social, sexo ou
grau de instrução; e 3º) Mostra a
expansão do cristianismo, que começou em um pequeno lugar na Palestina e em
pouco mais de trinta anos chegou a Roma[8].
Segundo
Arival Dias Casimiro, além de outros propósitos que podem ser apresentados, o
livro tem dois propósitos relacionados a missões: 1º) O de motivar o crescimento da igreja e; 2º) o de oferecer aos cristãos um manual de missões[9].
Esse
livro, além de seu valor histórico, “tem um valor teológico e prático
permanentes para os cristãos de todas as épocas”[10].
Se
observarmos os princípios contidos no livro de Atos, entenderemos “que a obra
de Deus é feita pelo poder de Deus, pelos recursos de Deus e dentro da metodologia
de Deus”[11].
MacArthur
diz que “Atos é pródigo em transições: do ministério de Jesus para o ministério
dos apóstolos; da antiga aliança para a nova aliança; de Israel como nação para
a Igreja (composta tanto de judeus quanto de gentios) como povo testemunha de
Deus”[12].
Para
Carlos Osvaldo, “Atos talvez seja o melhor exemplo no Novo Testamento da
multiplicidade de propósitos de uma obra”[13]. Seus propósitos sejam eles, apologéticos, teológicos
ou didáticos, são enfatizados pelos estudiosos de acordo com sua abordagem
específica.
“O tema
central do livro de Atos é o progresso da mensagem do Reino das ruas estreitas
de Jerusalém no começo da década de a.D. 30 às colinas abafadas de Roma no
verão de a.D. 60. Este livro trata das forças, humanas e sobrenaturais, que
permitiram que o Evangelho de Jesus Cristo atingisse o centro do Império Romano
em menos de uma geração”[14].
Atos
dos Apóstolos tem sido esboçado de diversas maneiras com fins pedagógicos. O
esboço que vamos usar, com algumas adaptações, é o de Carlos Osvaldo, que fez
uma opção “por uma divisão do livro em duas partes, observando os seus limites
racial-geográficos, com os doze primeiros capítulos tratando do crescimento do
evangelho no mundo judaico ou palestiniano, e os últimos dezesseis descrevendo
o mesmo fenômeno no mundo gentílico”[15].
“... mas
recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas
testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins
da terra”. Atos 1.8
Continua...
[1]
John MacArthur, Bíblia de Estudo MacArthur, SBB, 2010, p. 1433.
[2] Ibid., p. 1433.
[3] Ibid., p. 1315
[4] Ibid., p. 1433
[5]
Arival Dias Casimiro, Plante Igrejas, p. 18.
[6]
Ibid., p.19.
[7]
Apostila Interpreting the Book of Atcts, Baker, 1995; tradução e resumo de
Paulo Sergio Gomes.
[8]
Arival Dias Casimiro, Plante Igrejas, p. 19, 20.
[9] Ibid., p. 21.
[10] Ibid., p. 17.
[11] Ibid., p. 8
[12]
MacArthur, p. 1434.
[13]
Carlos Osvaldo Cardoso Pinto, Foco e Desenvolvimento no Novo Testamento,
Hagnos, 2008, p. 188.
[14]
Ibid., p. 191.
[15]
Ibid., p. 191